4 minutos de leitura 24 mar 2022
Architect inspecting the building

O desafio da escassez de mão de obra na construção

por Luís Rosado

Partner, Real Estate, Hospitality & Construction, Assurance Services, Ernst & Young Audit & Associados – SROC, S.A.

Envolvido no desenvolvimento de atividades de mercado e responsável por atividades importantes de gestão interna. Apaixonado por desafios. Surfista e viajante.

4 minutos de leitura 24 mar 2022

A falta de talento, a transformação digital, a sustentabilidade e a pressão sobre os preços são dificuldades com que o setor da construção e obras públicas se depara.

O ano de 2022 será um ano de importante transformação, pleno de importantes desafios que importa continuar a trabalhar para garantir crescimento sustentado. 

Apesar de todas as conhecidas condicionantes provocadas pela pandemia da COVID-19, a fileira da construção demonstrou invejável resiliência no ano de 2021 e deu importante contributo para a economia nacional, como demonstram os últimos dados disponíveis.

De acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE), em 2021, o volume de negócios e o emprego na construção aumentou, respetivamente, 2% e 3% face a 2020, contrariando, em certa medida, o choque provocado pela pandemia. Ainda assim, os dados preliminares disponíveis apontam para uma trajetória do setor da construção em linha com os padrões do passado, estando fortemente sincronizada com a evolução do PIB.

Variação homóloga trimestral | 2004-2021 (em %)

Fonte: INE, Banco de Portugal e Eurostat

No contexto da Europa, a atividade da construção em Portugal teve uma queda mais atenuada face a Estados congéneres europeus no primeiro trimestre de 2021. Nos dois trimestres seguintes, o índice de produção na construção iniciou uma trajetória de recuperação, não tendo, todavia, alcançado os níveis das principais economias europeias.

Ainda assim, a construção nacional evoluiu de forma mais favorável do que a de economias como a Alemanha (7,6 vs 2,1 no 2º Trimestre; 2,1 vs 1,4 no 3º Trimestre) ou a Espanha (2,1 vs -11,2 no 2º Trimestre). No penúltimo trimestre de 2021, a variação homóloga trimestral superou inclusive a média da UE27.

Variação homóloga trimestral do índice de produção na construção | 2021 (em %)

  2021 T1 2021 T2 2021 T3

Alemanha

-4,7

2,1

1,4

Áustria

9

24,9

4,3

Bélgica

6,9

12,3

-1,7

Croácia

8,5

15,7

8,3

Dinamarca

7,2

8,2

7,1

Espanha

-9,9

2,6

-11,2

França

13

38

-1,6

Grécia

-5,5

16,1

3,6

Hungria

-1,2

13,7

15,6

Irlanda

-31,6

29,4

-0,9

Itália

21,6

59,8

9

Luxemburgo

8,9

22,9

-3,1

Países Baixos

-1,5

4

0,9

Polónia

-12,7

1,9

5,8

Portugal

-1,1

7,6

2,1

Rep. Checa

-5,4

2,5

1,7

Suécia

-1,5

-0,5

2,4

Suiça

-2,4

6,2

2,5

UE27

2,1

15,4

1,3

Zona Euro

2,9

17,9

0,9

Fonte: Eurostat

Em termos de atividade futura, perspetiva-se crescimento acelerado para o ano de 2022 e seguintes, alicerçado na vertente edificável, em face da consolidada competitividade do residencial, logístico e escritórios à escala internacional, e também nos projetos de infraestruturas induzidas pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e Plano Nacional de Investimentos (PNI).

É provável que a escalada nos preços dos materiais continue a verificar-se durante o ano de 2022, até se atingir estabilidade em toda a cadeia de abastecimento, particularmente na vertente de logística. O efeito é tendencialmente temporário, mas gera impactos imediatos na tesouraria e na margem dos contratos em curso, colocando o desafio de os renegociar com sucesso para reequilibrar a margem, particularmente no que se refere a contratação publica.

A recorrente escassez de mão de obra (sobretudo, qualificada) deverá continuar a ser um dos maiores desafios do setor e, talvez, aquele que mais urgentemente importa resolver, face ao esperado crescimento do mercado. A revisão das tabelas salariais, a revisão das profissões e categorias profissionais e a conversão dos programas de formação profissional, bem como medidas que facilitem a mobilidade internacional e a captação de mão de obra dos centros de emprego, serão instrumentos relevantes para atrair profissionais nacionais e internacionais, saindo valorizada e dignificada a perceção dos profissionais do setor. No entanto, estima-se que a transição para um modelo de construção de cariz industrial seja inevitável para suprir a escassez de mão de obra a longo prazo.

A transformação digital continuará a moldar a estratégia de longo prazo do setor, que tem assistido à entrada de novos players com abordagens disruptivas, mais agregadoras da cadeia de valor do negócio e alavancadas em tecnologia. O sucesso das empresas do setor dependerá da capacidade de integração das atividades da cadeia de valor do negócio, eliminando custos de distribuição desnecessários, aumentando a produtividade, controlando melhor os prazos de projeto e a qualidade final, alavancando o digital em todos os aspetos das suas operações para maximizarem o conhecimento que pode ser extraído desses dados, permitindo-lhes identificar novas oportunidades e ameaças nas suas cadeias de valor. Neste contexto, investir para renovar os sistemas de informação que permitam consolidar e integrar fluxos de dados, para assegurar a transformação digital, será fundamental.

O desafio da sustentabilidade vai ser o que maior transformação e desafios imprimirá ao setor. Desde logo porque os consumidores exigem cada vez mais produtos que sejam sustentáveis, e a estratégia de alocação de capital dos investidores tem privilegiado projetos sustentáveis, condicionando os projetos dos promotores. A tendência levará ao desenvolvimento de novas técnicas de construção, privilegiando a economia circular, massificação de modelos de produção de matriz industrial (ex: construção modular) e com maior incorporação de materiais sustentáveis e recicláveis. O desafio da sustentabilidade deverá ser encarado como uma oportunidade para alcançar uma vantagem competitiva. Construir edifícios e infraestruturas sustentáveis pode revelar-se um diferenciador chave.

Neste contexto, é fundamental as empresas do setor articularem uma estratégia ESG (Environmental, Sustainable, Governance).

Faça o download do estudo completo em  "Portugal: Desafios para 2022 – 3ª edição - Parte II".

 

Resumo

Em 2022, o setor enfrentará os desafios da sustentabilidade ambiental, da digitalização, da industrialização, da escassez de mão de obra e da pressão sobre os preços, contexto no qual as empresas de construção devem rever e adaptar a sua estratégia para continuarem a prosperar numa indústria que está a mudar rapidamente.

Sobre este artigo

por Luís Rosado

Partner, Real Estate, Hospitality & Construction, Assurance Services, Ernst & Young Audit & Associados – SROC, S.A.

Envolvido no desenvolvimento de atividades de mercado e responsável por atividades importantes de gestão interna. Apaixonado por desafios. Surfista e viajante.