6 minutos de leitura 24 jul 2023
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O Impacto das Privatizações e da Entrada em Bolsa dos Bancos Comerciais

por EY Angola

Firma de serviços profissionais multidisciplinares

6 minutos de leitura 24 jul 2023

A nível mundial é a incerteza macroeconómica e geopolítica, com impacto directo no sistema bancário, o que torna as “janelas de oportunidade” de IPO cirúrgicas e com condições de financiamento mais desafiantes. É com este princípio que pretendemos compreender quais quais os ângulos de análise para perspectivar a evolução do sector da banca na bolsa de valores.

Como ponto inicial, a nota dominante actual a nível mundial é a incerteza macroeconómica e geopolítica, com impacto directo no sistema bancário, o que torna as “janelas de oportunidade” de IPO cirúrgicas e com condições de financiamento mais desafiantes.  São hoje factores de volatilidade à escala global e fundamentais para a tomada de decisão das entidades e investidores, o aumento das taxas de juro pelos bancos centrais (Angola em contraciclo) e das taxas de inflação, pressões regulatórias e a agenda ESG. Neste contexto desafiante e de incerteza, quais os ângulos de análise para perspectivar a evolução do sector da banca na bolsa de valores? 

Existem diferentes motivações para a dispersão do capital em bolsa

Como ponto de partida para equacionar uma possível entrada em bolsa (IPO), os racionais e motivações estratégicas são variadas, sendo as mais comuns: a necessidade de diversificação do investimento, como alavanca para o crescimento e/ou internacionalização; e, por outro lado, veículo para saída / alteração da composição accionista. Estão neste target empresas de crescimento acelerado (startups), empresas detidas na totalidade pelo estado que pretendem alargar a privados e empresas em transição (seja sucessão familiar ou separação de modelos de negócio).

Em complemento, existem ganhos intangíveis resultantes de um IPO tanto do ponto de vista reputacional e reconhecimento de marca potenciados pelas obrigações de reporting adicionais e a promoção de práticas de gestão mais transparentes (corporate governance), por via de um maior escrutínio dos stakeholders (clientes; fornecedores; investidores; agentes económicos). Por outro lado, pode funcionar como veículo de atracção de talento e criação de incentivos a médio e longo para a gestão por via do acesso a equity. Por fim, permite valorizar, em modalidade de discounted cash flows (valor de mercado ou outras), activos cuja mensuração contabilística estava, até então, ao custo zero ou sem valor por força das regras de contabilidade adoptadas.

Numa perspectiva interna, a entrada em bolsa apresenta um conjunto de obrigações inerentes ao processo, desde logo a contabilização dos custos de montagem da operação (due diligences), o reforço das actividades de relação com o mercado e investidores, e os custos adicionais associados ao cumprimento dos requisitos regulatórios.

O mercado de capitais tem um efeito positivo na economia

O Banco Mundial confirma uma forte correlação entre os mercados de capitais e o crescimento económico e aponta para uma maior atenção dada aos mercados de capitais como um mecanismo que pode potencialmente ajudar a canalizar o financiamento do sector privado para sectores-chave e estratégicos da economia, das empresas, infraestruturas, habitação, pequenas e médias empresas e alterações climáticas.

Os mercados de capitais mobilizam poupanças adicionais para a economia, disponibilizando mais capital às empresas, viabilizando novos postos de trabalho e facilitar o crescimento dos salários reais. Do ponto de vista dos investidores e aforradores, oferecem oportunidades de investimento e instrumentos de gestão de risco (investimento mais atractivo em termos de retorno que os depósitos bancários, embora com um risco mais elevado). Além disso, se existir uma vasta gama de instrumentos, os mercados de capitais podem proporcionar aos investidores uma carteira diversificada, o que contribui para a gestão do risco e das áreas de actuação e desenvolvimento. A nível microeconómico, para as empresas que já beneficiam de acesso ao financiamento bancário, os mercados de capitais podem constituir uma alternativa importante, uma vez que diversificam as fontes de financiamento, com prazos de vencimento mais longos e condições económicas potencialmente melhores, reduzindo assim os custos globais de financiamento. Como referido anteriormente, os mercados de capitais são impulsionadores para empresas em fase de crescimento acelerado, empreendedores e para os governos. E embora alguns países possam aceder aos mercados de capitais internacionais, o desenvolvimento dos mercados de capitais locais pode aumentar o acesso ao financiamento em moeda local e, assim, ajudar a gerir melhor o risco cambial e a inflação.

A entrada de investimento estrangeiro parece favorecer a competitividade do sector bancário

Experiências passadas em diversos países parecem fornece provas da influência da propriedade no desempenho de instituições de crédito e na eficácia do sector bancário. Frequentemente é considerado que o desempenho dos bancos estatais é inferior ao dos bancos privados, no entanto, está longe de ser uma conclusão pacífica, existindo diversos factores associados transacção de ownership que podem condicionar a performance futura.

Ainda assim, parece existir uma influência positiva da entrada de bancos estrangeiros nos sectores bancários (seja em bancos estatais ou privados), principalmente em países em transição ou em desenvolvimento. A entrada de bancos estrangeiros mais eficientes (tecnologias e processos), cria um ambiente que força todo o sistema bancário a inovar e tornar-se mais eficiente e competitivo, principalmente depois de terem atingido uma quota de mercado agregada relevante.

O continente africano tem ainda um caminho a percorrer e um potencial por explorar

Numa retrospectiva ao continente africano, alguns países realizaram privatizações bem-sucedidas, atraindo investidores estrangeiros e fortalecendo os seus sistemas financeiros. Como exemplo, no final dos anos 1990, o Quénia privatizou vários bancos estatais, o que resultou num sector bancário mais diversificado e eficiente. O mesmo ocorreu em países como Gana, Uganda e Tanzânia, onde a privatização dos bancos contribuiu para o crescimento e desenvolvimento do sector financeiro.

Apesar de antiguidade não ser sinónimo de crescimento, a maior capitalização bolsista está na bolsa mais antiga de África - Joanesburgo - que representa, com base em dados da AFSIC, mais de 3/4 do market cap de todas as bolsas de valores africanas.

O facto de o continente africano representar entre 1% a 2% da capitalização bolsista global evidencia o potencial de um mercado que, desde 2000, viu abrir mais de metade das bolsas de valores actualmente existentes.

Angola tem dado passos em direcção a um sistema bancário mais maduro

Centrando no desafio nacional, a história da privatização da banca em Angola teve início após o término da guerra civil em 2002, quando o governo angolano iniciou um processo de reformas económicas e abertura do mercado.

O primeiro passo significativo foi o processo de privatização que ocorreu em 2003, com a criação do Banco Internacional de Crédito (BIC) por investidores angolanos e portugueses, com o objectivo de adquirir uma participação maioritária no Banco Angolano de Negócios e Comércio (BANC). Essa iniciativa marcou a entrada do sector privado no sector bancário angolano.

Desde daí, podem destacar-se alguns marcos relevantes com o caso do BFA que em 2016, através da venda de 48,1% de suas acções ao Banco BPI, ou em 2019, quando o governo angolano anunciou um novo programa de privatização, que incluía a venda de participações em vários bancos estatais, como o Banco Económico e o Banco de Comércio e Indústria (BCI). Este percurso, culminou em 2022, com a dispersão em bolsa do capital dos Bancos BAI (10%) e do BCGA (25%), contribuindo para a diversificação das operações da BODIVA, ainda com um peso maioritario das operações de divida publica (Ots/ BTs) e emissões de obrigações.

Um mercado de capitais mais maduro irá favorecer a entrada de capital estrangeiro

Em resumo, embora haja semelhanças com outros países africanos, as diferenças de contexto de cada País moldaram os desafios e os resultados do processo de privatização. A abertura de mercados, a atracção de investimentos estrangeiros, a melhoria da governança corporativa e a resolução de problemas nos bancos estatais são objectivos a atingir pela maioria dos países africanos que buscam privatizar seus sistemas bancários.

O mote para o mercado de capitais em Angola está dado, e passa por (1) alargar a base de investidores e (2) promover a criação de mais corretoras e sociedades distribuidoras. Se, sobre este ponto, a intervenção dos reguladores BNA e CMC, através de regulamentação (artigo 440 da Lei nº14/21 de 19 Maio), está a promover o alargamento da base de Sociedades Corretoras e Distribuidoras, em relação ao alargamento da base de investidores, o processo exige mudanças mais profundas como a educação financeira da população, de uma perspectiva interna, e a captação e flexibilização da entrada de capitais estrangeiros no mercado.

Artigo escrito por João Rueff Tavares, Diretor EY, Consulting Financial Services 

Resumo

Embora haja semelhanças com outros países africanos, as diferenças de contexto de cada País moldaram os desafios e os resultados do processo de privatização. A abertura de mercados, a atracção de investimentos estrangeiros, a melhoria da governança corporativa e a resolução de problemas nos bancos estatais são objectivos a atingir pela maioria dos países africanos que buscam privatizar seus sistemas bancários.

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