Transcrição do podcast EY Talk the Tax - Episódio 4 - Pilar 1 e Pilar 2

Aproximadamente 7 minutos de leitura | 10 de janeiro de 2022

Introdução

Olá, seja bem-vindo ao EY Talk The Tax, um podcast do Jornal Económico em parceria com a EY. Ao longo deste e dos próximos episódios vamos continuar a explorar os principais temas de fiscalidade que marcaram e continuarão a marcar a atualidade, com a ajuda de várias figuras da EY Portugal.

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Moderador

Temos connosco Paulo Mendonça, Partner EY, Tax Services e vamos falar do Pilar e do Pilar 2 e desta nova tributação dos negócios digitais. Paulo, quando falamos em Pilar 1 e Pilar 2 porquê esta necessidade de reforma da tributação dos negócios digitais?

Paulo Mendonça

Na verdade, há uma situação que tem evoluído ao longo do tempo que se prende com o facto dos negócios serem cada vez mais realizados através de plataformas digitais, nomeadamente as chamadas “apps”. Hoje em dia, a presença física nos países para levar a cabo determinado tipo de negócios já não é tão visível como antigamente, pelo que grande parte das transações ocorrem por via digital, sem presença física do fornecedor no país onde os serviços e os bens são consumidos e isso faz com que uma parte significativa da riqueza que é gerada nos países onde estão localizados os consumidores não seja capturada por esses mesmos países para efeitos fiscais.

Para combater esta situação, são vários os Estados começaram a introduzir taxas sobre os negócios digitais, nomeadamente dentro da União Europeia, que são taxas de valor relativamente baixo, mas que incidem sobre volumes muito significativos. Por isso, temos neste momento uma situação de propagação de diversas taxas em diversos países com configurações relativamente diferentes, a incidirem sobre a mesma realidade e tentou-se fazer uma harmonização desta realidade para permitir que estes países onde estão localizados os consumidores dos bens e dos serviços possam capturar a parte que lhes é devida em termos de tributação sobre os rendimentos que são gerados.

Moderador

E tem corrido bem?

Paulo Mendonça

Eu diria que as taxas que são aplicadas têm um nível de arrecadação relativamente interessante. Contudo, são taxas dispersas, pelo que geram alguns custos de contexto para os operadores económicos.

Moderador

E criam um desafio a nível de compliance?

Paulo Mendonça

Exatamente, os tais custos de contexto. Uma multinacional que opera em vários países, por exemplo as que operam na indústria dos serviços prestados e das vendas por via digital, têm neste momento que analisar em cada país onde estão se, para além dos impostos e taxas a que já estão sujeitas, ainda têm que pagar esta taxa adicional. 

A União Europeia, e a OCDE em particular, preocuparam-se com este fenómeno e quiseram harmonizar esta dinâmica. E é aqui que nasce a nova tributação dos negócios digitais, i.e. este novo ímpeto que é essencialmente levado a cabo pela OCDE, porque a União Europeia tentou fazê-lo mas não conseguiu por via de diretivas, e neste momento, a OCDE conseguiu reunir um consenso alargado a nível mundial, onde mais de 150 países subscreveram este acordo para a tributação dos negócios digitais, pelo que se espera que em breve teremos um modelo neste âmbito que resolva estas questões tão difíceis de resolver quando são encaradas unilateralmente por cada um dos países.

Moderador

E é este o nexo da territorialidade de que falava?

Paulo Mendonça

A questão do nexo da territorialidade é um aspeto muito importante porque é isso que permite a um determinado país tributar os negócios que uma multinacional faz no seu país. Na prática, o que é o nexo da territorialidade? No fundo, é uma conexão com o país: é existir uma instalação fixa, i.e., aquilo a que nós chamamos de estabelecimento permanente/estável (por exemplo: pessoas que levam a cabo atividades de vendas, etc.). Normalmente nos modelos clássicos de tributação, que é ainda um modelo que prevalece hoje em dia, tributamos uma multinacional que opera em Portugal se ela cá tiver um estabelecimento estável.

Moderador

Sabemos que esta situação é subjetiva. E porquê a necessidade de dois Pilares nesta reforma?

Paulo Mendonça

Foi preciso encontrar uma forma para fugir deste modelo de tributação com base num estabelecimento estável e passar para um novo modelo. Mas como é que vamos tributar estas novas realidades digitais? Para isso, a OCDE em conjunto com o G20 propuseram um modelo assente em dois pilares: o primeiro pilar prende-se com a seguinte questão: “Como é que vamos obrigar as empresas multinacionais a alocarem uma parte dos seus rendimentos aos países onde estão os consumidores?”; e o segundo com “Essas empresas podem estar instaladas em qualquer país e poderão, eventualmente, escolher até jurisdições de baixa tributação.” No fundo, o segundo Pilar, é uma taxa de imposto mínima que vai ser imposta a todos os países.

Moderador

Quem é que qualifica para o Pilar 1?

Paulo Mendonça

Para o Pilar 1 serão as grandes multinacionais, ou seja, aquelas que têm vendas globais superiores a 20 biliões de euros. Ainda estamos num plano onde teremos provavelmente 200 empresas se inserem neste cenário.

Moderador

A nível de PR também seria um pesadelo começar pelas empresas pequenas e depois passar para as grandes. De certeza que iria correr mal a longo prazo.

Paulo Mendonça

Sem dúvida. É necessária toda uma adaptação para um novo modelo de negócio baseado em sistemas diferentes daqueles que temos hoje em dia. Nesta primeira fase, serão estas empresas.

Moderador

E quem é que fica excluído do Pilar 1?

Paulo Mendonça

Conseguiram ficar excluídos deste modelo os serviços bancários regulados e as indústrias extrativas (carve-out).

Moderador

E quem é que qualifica para o Pilar 2?

Paulo Mendonça

Para o Pilar 2 o nível de exigência já é mais baixo e estamos a falar das multinacionais que têm um volume de proveitos global superiora 750 milhões de euros. 

Moderador

Mas também há exclusões neste Pilar?

Paulo Mendonça

Haverá algumas exclusões, mas não serão tão específicas como aquelas que se aplicam ao Pilar 1.

Moderador

Como é que já funciona este Pilar 2?

Paulo Mendonça

O Pilar 2 assenta na aplicação de uma taxa mínima de 15%.

Moderador

Não será complicado a nível global, porque estamos neste momento a instaurar um processo de compliance e de fiscalização que será feito à escala global e que nunca foi feito antes?

Paulo Mendonça

Já começou a ser testado um modelo supranacional – instrumento multilateral - que vai ser subscrito. Na verdade, isto não vai obrigar a que cada país celebre com outro país um tratado/acordo.

Moderador

Estou a imaginar à escala nacional é fácil instaurar um processo de diligência desta magnitude, mas à escala global haverá sempre uma margem de burocracia difícil de controlar.

Paulo Mendonça

Sim. Isto será feito numa lógica multilateral num acordo supranacional. Ainda não é muito claro sobre quem vai supervisionar esta dinâmica e se calhar era interessante voltar um bocadinho atras para percebermos de uma forma simplificada o seguinte: no Pilar 1 como é que é feita a locação dos rendimentos que são gerados nos diferentes países por essas tais multinacionais. Resumidamente, vai ser necessário perceber se a empresa tem 20 biliões de euros de faturação, 10% de resultado antes de imposto (2 biliões de euros) e acima desse valor se tem 25% para distribuir pelos diferentes países onde a empresa opera, desde que a mesma aufira nesses países de rendimentos superiores a 1 milhão de euros.

Moderador

Falta apenas colocar-lhe uma questão, aquela que será a mais pertinente: como será implementado na prática e quando?

Paulo Mendonça

Essa é a grande questão. Tivemos avanços e recuos, por exemplo no tempo da presidência anterior dos EUA de Donald Trump onde o sistema foi parado e agora Joe Biden deu um novo impulso, pelo que está tudo a ser preparado para que, ao nível do Pilar 1 este acordo multilateral possa ser assinado já em 2022 para entrar em vigor em 2023; e o Pilar 2 também se espera que seja incorporado na legislação doméstica de cada um dos países (o tal requisitado dos 15%) em 2022 para entrar em vigor em 2023.

Moderador

Não será um objetivo demasiado ambicioso?

Paulo Mendonça

Eu penso que sim. Estando envolvidos mais de 150 países será difícil, mas acho que a OCDE e o G20 colocam prazos apertados já sabendo que poderá haver alguma derrapagem caso pusessem prazo muito longos.

Moderador

Paulo Mendonça, muito obrigado por se ter juntado a nós. Este foi o quarto episódio do EY Talk the Tax. Obrigado por ter estado desse lado e já sabe: guarde o EY Talk The Tax na sua app de podcasts para que seja notificado sempre que sair um novo episódio. Regressamos já no dia 17 de janeiro. Não perca.