Transcrição do podcast EY Talk the Tax - Episódio 7 – Digitalização na Função Fiscal

Aproximadamente 7 minutos de leitura | 31 de janeiro de 2022

Introdução

Olá, seja bem-vindo ao EY Talk The Tax, um podcast do Jornal Económico em parceria com a EY. Ao longo deste e dos próximos episódios vamos continuar a explorar os principais temas de fiscalidade que marcaram e continuarão a marcar a atualidade, com a ajuda de várias figuras da EY Portugal.

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Moderador

Esta semana temos connosco Ricardo Xavier Correia, Director da EY, Tax Technology & Transformation, que nos vai elucidar um pouco sobre a transformação digital da função fiscal.

Ricardo, bem-vindo, e obrigado por se juntar a nós aqui no Jornal Económico. É cada vez mais recorrente falarmos dos desafios da digitalização na função fiscal, que apesar de terem ganho força com o contexto pandémico eram, ainda assim, já uma tendência que decorria das iniciativas de modernização que foram feitas na Administração Tributária e Aduaneira. Mas na sua opinião e para arrancarmos esta conversa, quais é que são os principais desafios atuais no contexto da digitalização da função financeira e fiscal em Portugal?

Ricardo Xavier Correia

Atualmente, existem vários desafios da função financeira e fiscal em Portugal. O primeiro grande desafio é a adoção de tecnologia: este é o principal e o desafio chave da função fiscal, uma vez que é crítico para dar resposta ao novo contexto de digitalização das Administrações Tributárias onde a tecnologia já é hoje um fator chave para o acesso e controlo de dados. Vejamos os seguintes exemplos: a implementação do QR code nas faturas e documentos fiscalmente relevantes, a possível utilização do ficheiro SAF-T para corroborar os limites declarativos do IVA e um possível preenchimento da IES com o ficheiro SAF-T da contabilidade. O segundo grande desafio é a transição para um modelo operativo digital e isso passa por adaptar / adotar novos processos e adequar pessoas de acordo com as novas exigências do mundo atual. Nesse sentido, as organizações têm vindo a alterar os seus modelos de negócio, bem como as suas relações com clientes e fornecedores. No fundo, a função financeira e fiscal está num momento de adequação necessária a este novo contexto de digitalização. Isto também passa por trocar atividades de baixo valor acrescentado por atividades de maior valor acrescentado. O terceiro grande desafio é a gestão de dados de grande dimensão, ou seja, dados não estruturados, que é necessário ter agora capacidade de gerir e analisar, mas também fazê-lo de forma rápida, a um custo baixo e com elevada precisão e qualidade. 

Moderador

Ricardo, como é que vê o estado de preparação das empresas portuguesas na transição para este novo modelo digital?

Ricardo Xavier Correia

As empresas portuguesas ainda se mantêm, em grande medida, a operar num modelo tradicional. Ou seja, baseiam a sua atividade num tratamento manual da informação utilizando um ou mais sistemas de informação contabilísticos que não respondem às exigências particulares de funções, como claramente a função fiscal.

Considerando a atual capacidade da administração fiscal para aceder e inferir sobre dados extraídos diretamente dos sistemas de informação das empresas (por exemplo: utilizando o ficheiro SAF-T), todo o processo decorrente do tratamento manual de dados executado pela função financeira e fiscal ficará rapidamente obsoleto. 

Moderador

Há pouco falava dos QR codes e dessas novas tecnologias – quais é que identifica neste patamar das tecnologias emergentes como mais relevantes para a função financeira e fiscal?

Ricardo Xavier Correia

Existem cada vez mais tecnologias que demonstram valor acrescentado quando adaptadas à função financeira e fiscal. Tecnologias como a inteligência artificial, pela sua capacidade de analisar a tal quantidade de dados não estruturados e com elevada dimensão; o RPA que é a automatização de processos, pela sua capacidade de automatizar processos manuais e de integrar atividades entre diferentes processos e tecnologias / sistemas; os RP’s de nova geração: são softwares de contabilidade e faturação que garantem maior capacidade de integração para a empresa como um todo no processamento de dados; a Blockchain e a Data Analytics que são tendências que começaram recentemente e que vão aumentar a sua adoção por parte das empresas nacionais e internacionais.

Moderador

Quais são os principais benefícios que estas novas tecnologias trazem para o modelo operativo tradicional? A que revolução é que vamos assistir com estas ferramentas?

Ricardo Xavier Correia

Todas as tecnologias de que estivemos a falar agora trazem muitos benefícios no que toca à melhoria da performance dos processos da função fiscal e financeira. Este é um dos grandes benefícios e um dos fatores chave necessário em Portugal, sobretudo no contexto em que vivemos de um retomar económico. Para além disso, estas tecnologias também vão permitir criar valor não só pela redução de custos, mas também pela capacidade de garantir apoio à tomada de decisão, bem como renovar as equipas de trabalho em que estas terão que se adaptar às novas tecnologias e deixar trabalhos mais rotineiros de processamento de dados para funções de análise de dados. No fundo, penso que tudo isto traz um novo modelo operativo onde um conjunto de tarefas que é hoje em dia histórico passa para uma nova filosofia / necessidade de trabalho das próprias pessoas que trabalham na função financeira e fiscal onde passarão a ter uma intervenção muito mais ativa, permitindo mitigar riscos de forma eficaz e aumentar os resultados da empresa. 

Moderador

No seu entendimento, porque é que este investimento na capacitação tecnológica da função financeira e fiscal ainda é tão reduzido no nosso país?

Ricardo Xavier Correia

A função financeira e fiscal, e principalmente a fiscal, continua a ser considerada um centro de custos e não de resultados, logo não tem sido um foco do investimento das empresas. Mesmo quando se trata de investimento tecnológico significativo para a função financeira e fiscal, como no caso dos novos RP’s, mesmo aí, a função fiscal não tem estado envolvida na especificação funcional ou no desenvolvimento destes sistemas. Claro que isto agrava o distanciamento da adaptação tecnológica e chega-se a um ponto onde o investimento necessário para responder a todas as necessidades da função fiscal é cada vez maior. O facto de o investimento ser cada vez maior, torna-se mais difícil a concretização do mesmo.

Também não tem existido uma renovação significativa das equipas que trabalham nestas áreas – estas pessoas ainda não têm backgrounds tecnológicos, de gestão de projetos ou de reengenharia de processos, ou seja, têm um perfil ainda algo avesso a novas tecnologias.

Moderador

Crê que essa versão é crónica?

Ricardo Xavier Correia

Tem de ser reversível e já o é em muitas empresas internacionais, pelo que o mesmo tem de acontecer nas empresas portuguesas. É uma necessidade do contexto atual muito impulsionado pelas Autoridades Tributárias, mas também por todos os stakeholders da própria empresa. Ou seja, todas as relações que a empresa tenha com os seus fornecedores, clientes, áreas dentro da própria empresa, onde a adotação tecnológica é fundamental para fazer novos negócios.

Moderador

Para terminar esta conversa, o que é que podemos esperar não só para 2022 como para os próximos anos? Em resumo, o que é que falta fazer no novo ciclo de retoma económica em que vamos entrar e perante os planos de incentivos à modernização que já sabemos que vão estar em curso?

Ricardo Xavier Correia

A função financeira e fiscal tem agora esta oportunidade de recuperar o tempo perdido, aproveitando os novos incentivos que existem para investir tanto em tecnologia como em formação das equipas a nível de processos e da própria tecnologia.

Este investimento deve motivar a criação de uma nova dinâmica de inovação e de melhoria contínua nos próprios processos e à adaptação da tecnologia destas áreas. No fundo, criar um novo modelo operativo disruptivo do modelo tradicional.

Isto não passa apenas por um investimento pontual numa funcionalidade específica como estávamos a falar há pouco do QR code e se ficar por aí, então vai continuar sempre a haver este atraso porque os investimentos isolados não servem para fazer uma verdadeira transformação. Contudo, tem de haver investimento significativo e sério tanto em termos tecnológicos como em termos de pessoas e existir um plano estruturado e uma gestão de projeto forte – patrocinado pela gestão de topo – que, face ao estado atual, faça um acompanhamento e uma implementação para um estado ambicionado. Isto, é sem dúvida, o que falta fazer.

Moderador

E está otimista?

Ricardo Xavier Correia

Sim, estou.

Moderador

Ricardo Xavier Correia, muito obrigado por se ter juntado a nós. Este foi o sétimo episódio do EY Talk the Tax. Obrigado por ter estado desse lado e já sabe: guarde o EY Talk The Tax na sua app de podcasts para que seja notificado sempre que sair um novo episódio. Não perca.