Por Karen Machado, Gerente Sênior de Forensics da EY e Flavia Husek, Gerente Sênior de Forensics da EY
Elas estão cercadas de uma gama de terceiros como fornecedores, parceiros de negócios, funcionários, entre outros que apoiam na execução dos processos e são parte importante para o alcance de seus objetivos operacionais e estratégicos. Apesar de essenciais para as empresas, os terceiros podem ter um impacto reputacional, econômico, financeiro, jurídico enorme, caso seus riscos de integridade não sejam avaliados e gerenciados pela empresa contratante.
A gestão de terceiros protege a companhia e, há anos, as práticas de consulta a indicadores financeiros, antes do início da relação, e a bases de dados que provêm informações sobre aspectos reputacionais e de corrupção se sedimentaram no dia a dia das empresas mais maduras. Embora o assunto sobre fatores ambientais, sociais e de governança seja muito mais antigo, a pressão por transparência sobre essas questões é cada vez maior e é natural que haja dúvida sobre quais riscos de Environment, Social and Governance (“ESG”) avaliar em terceiros.
Riscos financeiros, reputacionais e de corrupção devem ser tratados dentro da pauta ESG, portanto a gestão de riscos ESG não vem para substituir os até então sedimentados procedimentos de análise de riscos, mas sim, para abrigar tais pautas e expandir ainda mais o leque de informações que uma empresa deve monitorar e avaliar em seus parceiros de negócios. A análise de riscos de integridade em ESG fará com que a Companhia possa adotar um processo perene, sustentável e atualizado de avaliação dos seus terceiros.
Além disso, neste novo cenário em que a interdependência com os terceiros é cada vez maior e mais complexa, aliar a gestão de riscos de integridade em ESG com o uso de tecnologia é essencial para trazer eficiência e tempestividade à análise e, com isso, ter a capacidade de avaliar grande quantidade de terceiros e garantir velocidade na tomada de decisão, para equilibrar os riscos e benefícios de cada contratação.
Assim, o tema de análise de riscos ESG ganhou relevância como norteador para o processo de gestão de terceiros. O desafio, agora, gira em torno de manter efetivo e atualizado o processo de análise de riscos de integridade de terceiros, em especial a etapa da Due Diligence, que deve ser realmente efetiva, tempestiva, analítica e prevista em procedimento, como parte de um processo estruturado.
Além do processo exigente de contratação, é necessário manter um monitoramento efetivo dos terceiros ao longo do tempo, considerando que, por vezes, novos riscos de ESG possam aparecer, sem terem sido identificados antes, como: envolvimento em investigações da Polícia Federal, certidão negativa de débitos, registro de empregadores que submeteram os funcionários em condições análoga à escravidão, pessoas politicamente expostas contratadas, empresas que assinaram acordo de leniência, entre outros. Manter esse monitoramento de terceiros constante e vivo é uma das dificuldades que verificamos no processo.
Dois principais aspectos dificultam a eficiência: o volume de terceiros cada vez maior e a volatilidade das relações. Por um lado, as empresas se relacionam com cada vez mais terceiros, tornando muito difícil o monitoramento contínuo dos riscos para a tomada de decisão. Por outro, devido aos acertados processos de avaliação de terceiros exigirem cotações, background checks e screening periódico, essas relações são voláteis, o que faz com que terceiros sejam descontinuados e substituídos por novos. Acompanhar as mudanças e a dinâmica corporativa de terceiros é um desafio, porém uma mudança necessária.
Não obstante a importância inegável do tema, há uma crescente pressão dos investidores, do governo e da sociedade, que passam a reforçar a reflexão das empresas sobre sua responsabilidade perante à cadeia de suprimentos, considerando que, para se ter sucesso na implantação de um programa efetivo de ESG, as empresas devem incorporar a gestão dos terceiros em sua estratégia. Nesse sentido, é imprescindível entender os impactos ambientais, econômicos, sociais dos produtos e serviços ao longo de toda sua cadeia, para que se possa realizar a gestão de riscos de integridade necessária para a tomada de decisão.
Alguns dos países que já possuem legislações vigentes neste aspecto são França, Austrália, Países Baixos, Suíça, Noruega e Alemanha. Além destes, há outros com projetos legislativos em avaliação, como Áustria, Bélgica, Dinamarca, Finlândia, Itália, Luxemburgo, Espanha Suécia e Países Baixos (este, para ampliar o escopo da legislação já existente).
Sendo o Brasil um mercado relevante no cenário global como exportador de commodities e pensando na expressiva agropecuária brasileira, obviamente será fortemente impactado pelas legislações internacionais e não demorará para que o Brasil crie sua própria legislação, até mesmo para que esteja em conformidade com as internacionais e demonstre o mesmo comprometimento sobre o tema que os seus importadores.
Criando um paralelo com a legislação anticorrupção brasileira, que traz a prevenção à corrupção como um atenuante sobre eventual sanção administrativa, bem como a responsabilidade objetiva da companhia, certamente responsabilizar-se pela cadeia de terceiros sob o aspecto ESG será o caminho dos legisladores. Assim como, para o arbitramento das condenações, acredita-se que eventuais indenizações considerará a gravidade da situação, a repercussão, a extensão do dano e a condição de reparação social e financeira.
Nesse contexto, no que tange à gravidade, o dever de diligência, a cautela ou prudência mínima serão considerados. As empreas não poderão alegar desconhecimento, precisarão dominar o processo, conhecer sua cadeia de suprimentos e de terceiros, de modo geral.