O setor agropecuário é hoje responsável por um quarto das riquezas produzidas no Brasil. Só nos três primeiros meses deste ano, respondeu por 7,7% do PIB nacional – o equivalente a R$ 233,8 bilhões do total de R$ 3,01 trilhões. Considerando-se o todo, ou seja, indústria, transporte, comércio e serviços relacionados, esses números são ainda maiores, elevando a conta para uma porcentagem acima de 25% do PIB brasileiro.
Em contrapartida, a pressão das mudanças climáticas sobre os resultados do negócio vem aumentando. De acordo com a Confederação Nacional de Municípios (CMN), entre 2013 e 2020, os eventos extremos causaram prejuízos de R$ 287 bilhões à agropecuária, com perdas registradas em 6,8 milhões de hectares de lavouras (área correspondente aos Estados do Rio de Janeiro e de Alagoas), principalmente por causa das secas. O levantamento foi realizado com base nos dados de um sistema sobre desastres vinculado ao Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional.
Otavio Lopes, sócio-líder da EY em Agro para América Latina, lembra que a perda de safra é o maior desafio para qualquer produtor, independente do seu tamanho: pequeno, médio ou grande. O Rio Grande do Sul, que é altamente vulnerável a estiagens e outras intempéries climáticas, perde uma safra de soja a cada quatro colhidas. “No país como um todo, a falta de chuvas também traz outro problema: o aumento do preço da energia elétrica, que impacta o custo operacional dos produtores. Entre as consequências estão alimentos mais caros para os consumidores, já que parte da elevação dos custos é repassada ao longo da cadeia, chegando ao preço final”, destaca.
Práticas sustentáveis para mitigar os efeitos das mudanças climáticas
As mudanças no padrão climático, como chuvas, o empobrecimento e a erosão dos solos, vem impactando o plantio de culturas e a criação de animais em todo o mundo, já que essas atividades dependem de serviços ecossistêmicos harmônicos. As próprias atividades mais intervencionistas do agro em relação ao solo, com uso de grandes maquinários, acabam por impactar o ciclo de água, prejudicando o armazenamento e infiltração da água no solo, e seu consequente retorno para as bacias hidrográficas.
Felizmente, a agropecuária brasileira lidera em termos de sustentabilidade, com uma série de práticas reconhecidas globalmente. A chamada agricultura regenerativa recupera áreas degradadas e restabelece o ecossistema, evitando avançar por novas áreas, pois aumenta a produtividade das terras já cultivadas ou exploradas. O plantio direto é outra prática com potencial para garantir a manutenção da flora e da fauna. Destacam-se ainda o uso responsável e planejado da irrigação e a preocupação crescente em se evitar o uso de químicos, como pesticidas, que se infiltram no solo e contaminam lençóis e bacias hidrográficas.
Nesse sentido, o manejo biológico vem ganhando espaço em quase todas as culturas, reunindo o uso de agentes não químicos (biológicos) e a inserção de elementos que regulam o ambiente. Também a técnica de zoneamento agrícola, que prevê exatamente o que será plantado em cada região, assegura ao produtor a produtividade desejada. A combinação de zoneamento agrícola, microclima e solo é poderosa para definir, já de início, a estratégia correta para cada região. Em locais que sofrem com estresse hídrico, por exemplo, o indicado é escolher cultivos ou plantações que sejam tolerantes a essa condição. Algumas sementes estão sendo desenvolvidas com essa resiliência ao clima.
Custo de produção
No Brasil, cuja matriz energética principal é a hidrelétrica, a escassez de chuvas acaba por aumentar a conta de energia, com a chamada bandeira tarifária vermelha, impactando o custo de produção agropecuária. A irrigação, por exemplo, que requer energia elétrica, torna-se mais cara. Em um contexto de temperaturas médias mais altas, há a necessidade de se irrigar mais, o que torna a produção ainda mais cara.
Paralelamente, os produtores estão sujeitos à pressão dos ciclos econômicos. O custo mais alto de capital tem trazido incertezas para os mercados globais. Nesse contexto, os produtores precisam fazer uma escolha: investir em sustentabilidade ou acelerar a conversão do capital obtido em receita. Considerando os enormes desafios atuais para a obtenção de capital, grande parte acaba optando pelo segundo caminho, o que dificulta o investimento em avanços tecnológicos que trazem melhorias para a sustentabilidade no campo. O problema é ainda mais crítico para os pequenos produtores ou agricultores familiares, que historicamente enfrentam maiores dificuldades para acessar linhas de crédito, especialmente as oferecidas pelas instituições financeiras privadas. O ideal seria diminuir o custo do capital por meio do incentivo ao crédito mais barato.
Há, portanto, uma assimetria de acesso às tecnologias entre os produtores. Os maiores, equipados com as melhores técnicas de produção, têm uma produtividade maior e mais sustentável frente aos menores. Na Indonésia e na Malásia, por exemplo, um dos grandes desafios foi equipar com tecnologia os pequenos produtores de óleo de palma, que enfrentavam dificuldade para acessar capital. Esses países constataram que, sem acesso a técnicas modernas de produção, o produtor esgota seu solo de cultivo e tende a expandi-lo, aumentando a área plantada ou explorada por meio do desmatamento.
Assim, para garantir a sustentabilidade no campo, o pequeno produtor precisa de crédito para acessar tecnologias que envolvam técnicas de irrigação, manejo ou controle biológico, equipamentos de precisão, além de um programa de educação sobre o uso desses recursos.
A expectativa é que essa discussão seja aprofundada na COP30, com a movimentação de agentes a favor de destinar parte do financiamento climático global aos pequenos e médios produtores rurais, para viabilizar a implantação de tecnologias de baixo carbono no processo produtivo e escalar as ações de mitigação e adaptação climáticas.
O potencial da inteligência artificial no campo
A Inteligência Artificial - IA tem várias aplicações na agricultura, com impacto em todas as variáveis de sustentabilidade. Agiliza, por exemplo, o estudo das variantes genéticas das plantas ou dos cultivos, por meio de modelos computacionais poderosos, e combina informações georreferenciadas, via drone ou satélite, beneficiando toda a indústria.
Assim, o produtor pode identificar padrões de espaçamento de plantio, contar o número de árvores por hectare, bem como calcular a produtividade em determinada área. Há ainda imagens que mostram padrões de estresse de condição nutricional ou de água, dando insumos para que ele possa agir. Ou seja, possibilita uma intervenção mais precisa e o tratamento adequado para a recuperação da terra.
Vale destacar que a agricultura de precisão assegura o funcionamento harmônico do ecossistema, otimizando, inclusive, a aplicação de químicos, já que a máquina agrícola, equipada com sensores, faz a leitura instantânea da plantação, calculando corretamente a quantidade e os locais onde devem ser realmente aplicados.