Como as mineradoras de ouro poderão ser competitivas no longo prazo

As mineradoras de ouro estão aproveitando os preços altos e aumento da demanda, para ampliar o portfólio. O ESG é pauta crucial na agenda.


Em resumo

  • Os preços incentivaram as mineradoras de ouro a investir no aumento da base de ativos por meio de atividades de exploração e de fusões e aquisições.
  • As empresas se esforçam para adotar práticas responsáveis de mineração do ouro, com foco na manutenção do perfil das emissões e nos desafios sociais.
  • As mineradoras estão de olho na extração econômica de minério de teor mais baixo e na digitalização, a fim de gerar valor de longo prazo.

Em 2023, o aumento do preço do ouro incentivou as empresas do segmento a expandirem a base de recursos e tornarem suas operações mais sustentáveis. O ouro dominou os orçamentos de exploração de commodities e as empresas fecharam transações de ativos de alto valor, com foco renovado no crescimento orgânico e inorgânico. O ímpeto do mercado deu suporte às margens, enquanto os ventos contrários da inflação elevaram o custo global de produção (AISC, na sigla em inglês), superando as máximas anteriores.

A demanda anual geral por ouro aumentou 17% em relação ao ano anterior, para 4.699t em 2022, a maior alta em 11 anos, devido às compras substanciais feitas pelos bancos centrais, ao aumento nos investimentos do varejo e à desaceleração nas saídas de ETFs. No entanto, a demanda por ouro nos 9M23 diminuiu 3% em relação ao mesmo período anterior, para 3.286t, com uma queda nos investimentos devido a grandes saídas de ETFs, mas acima da demanda média dos três anos de 9M19-21.[1]

Espera-se que a adoção da inovação nas operações existentes por meio de iniciativas de digitalização e eletrificação, impulsione a eficiência operacional e de custos. O número cada vez maior de depósitos com baixo teor de ouro torna a exploração por meio de métodos econômicos e ambientalmente corretos essencial para as mineradoras. O perfil de produção sustentável, e não sua característica de porto seguro, deverá fortalecer a posição do ouro como o ativo de investimento preferido dos investidores.

Foco atual das mineradoras de ouro

A lucratividade está direcionando as mineradoras a uma maré agressiva de fusões e aquisições

Embora o número de negócios do segmento do ouro tenha reduzido de 133 em 2021 para 118 em 2022, o valor do negócio aumentou 58% em relação ao ano anterior, para US$ 21,5 bilhões em 2022.[2] Com as taxas de inflação levemente moderadas em comparação ao ano anterior e as mudanças nas taxas de juros em 2023, as mineradoras de ouro com capitalização média estão buscando escalar e alavancar sinergias operacionais, apostando no alto preço do ouro e em margens robustas.

Os principais negócios de ouro em 2023 incluíram a aquisição da Yamana Gold pela Pan American-Agnico Eagle com uma oferta em dinheiro e ações no valor de ~US$ 4,8 bilhões para expandir suas operações na América Latina e consolidar a propriedade da Yamana em suas operações em Malartic, Québec. [3]

A média anual do AISC superou as máximas históricas de 2012, chegando a US$ 1.276/oz

Níveis de inflação mais altos do que os níveis pré-Covid e problemas de fornecimento influenciaram os custos das minas, como mão de obra, combustível e eletricidade nos últimos trimestres. O custo global de produção (AISC) médio do ouro aumentou 18% em relação ao ano anterior, para US$ 1.276/oz em 2022, superando os recordes de 2012.[4]

Esse custo aumentou ainda mais e atingiu a média de US$ 1.337/oz no 1S23[5], colocando as minas de ouro que operam a um custo alto sob o estresse operacional de fechamento temporário ou cortes de produção.

Regionalmente, espera-se que as Américas continuem como uma região de alto custo, com um AISC médio de US$ 1.299/oz em 2023, devido ao aumento nos custos de mão de obra e combustível.[6]

O ouro deve dominar a exploração com 46% do orçamento total destinado ao metal amarelo

O orçamento total para a exploração do ouro deve atingir US$ 5,9 bilhões em 2023, uma queda de 16% em comparação à maior alta em nove anos de 2022, mas contribuindo com 46% do orçamento total para a exploração.

O valor destinado pelas grandes empresas ao ouro deve totalizar US$ 2,9 bilhões, pouco acima do orçamento das empresas menores, de US$ 2,3 bilhões. Somados, esses valores representam 87% do total destinado ao ouro.

Durante o ano, as atividades de exploração continuaram mais focadas em projetos em minas e que estejam em estágio avançado, em vez de projetos em estágio inicial.

Regionalmente, o Canadá deve registrar a fatia maior, ou seja, de 23% do orçamento para o ouro de 2023, no valor de US$ 1,4 bilhão, seguido pela Austrália e América Latina.[7]

As compras pelos bancos centrais registraram crescimento de 14% para 800t nos 9M23 em relação ao período anterior, impulsionando outro ano notável de compras líquidas

As compras pelos bancos centrais registraram a maior alta em 55 anos, com um crescimento de 140% em relação ao ano anterior, para 1.082t em 2022, apoiadas principalmente pelos mercados emergentes, inclusive a Turquia e a China. Continuando essa tendência, as compras pelos bancos centrais aumentaram 14% em relação ao período anterior, para 800t nos 9M23. A demanda por investimento aumentou 12% em comparação ao ano anterior, para 1.113t em 2022, com uma demanda sustentada por barras e moedas e uma desaceleração na venda líquida de ETFs. No entanto, os investimentos caíram 21% em relação ao período anterior, para 687t no acumulado do ano, com as saídas de ETFs.

Em termos de demanda física, o consumo de joias caiu 3% em relação ao ano anterior, para 2.090t em 2022, devido aos altos preços locais do ouro em mercados como a Índia e a Turquia, e aos lockdowns relacionados à Covid na China. A procura por joias manteve-se estável nos 9M23 em comparação com o mesmo período do ano anterior, com incertezas econômicas persistentes e pressão dos preços nos consumidores.

A demanda por ouro pelo setor de tecnologia, por sua vez, caiu 6% em 2022 e 9% nos 9M23 em relação ao mesmo período anterior, devido a restrições comerciais, problemas na cadeia de suprimentos e queda na demanda pelo consumidor em meio à deterioração do cenário econômico global.[8]

As mineradoras estão fazendo avanços na divulgação ESG para aumentar a transparência para os investidores primários e secundários

À medida que o ouro ganha popularidade como ativo de investimento, espera-se que as mineradoras aprimorem cada vez mais suas práticas de divulgação ESG. Para assegurar um relatório de sustentabilidade com informações precisas, as mineradoras monitoram e analisam dados ESG de alta qualidade, com uma governança e controles fortes para garantir as devidas aprovações.

Algumas mineradoras adotaram soluções de monitoramento de dados ESG para agrupar e validar os dados digitalmente. Por exemplo, a Eldorado Gold usa uma solução ESG que ajuda a empresa a registrar, aprovar e reportar pontos de dados de uma forma que seja relevante para as várias diretrizes de divulgação.[9]

Próximos passos para as mineradoras direcionarem a transição

A adoção dos princípios de mineração responsável do ouro incentiva a adesão aos objetivos de desenvolvimento sustentável

As empresas do segmento do ouro que implementam os Princípios de Mineração Responsável de Ouro (RGMPs, na sigla em inglês), lançados pelo Conselho Mundial do Ouro, contribuem indiretamente para vários Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU (ODS) devido à interligação entre essas duas normas.[10]

Fonte: Análise da EY Knowledge do Relatório do Conselho Mundial do Ouro

Grandes mineradoras podem trabalhar com governos locais para formalizar e melhorar o status de garimpeiros e pequenas mineradoras

A mineração artesanal e em pequena escala do ouro ocorre em mais de 80 países, é o sustento de 15 a 20 milhões de pessoas e responde por 20% da oferta anual de ouro recém-extraído. A má gestão de sua coexistência com o ecossistema da mineração pode impactar significativamente sua competitividade no setor do ouro. Os governos locais desempenham um papel fundamental na determinação da interface ideal entre pequenas e grandes mineradoras e na formalização de seu status para melhorar os direitos sociais existentes.

Grandes empresas que atuam no segmento do ouro podem ajudar as pequenas mineradoras, facilitando seu acesso aos mercados, melhorando o desenvolvimento social, fornecendo treinamento e melhorando as práticas de saúde e segurança. Por exemplo, a B2Gold gerencia proativamente a exposição a pequenos mineradores em Mali, nas Filipinas e na Colômbia, com iniciativas em nível de local sendo buscadas, incluindo monitoramento regular e atividades de reporte e impactos ambientais, compra e processamento de minério extraído por mineradores de pequena escala fora das áreas de mineração para diminuir o uso de mercúrio (Filipinas) e consideração dos interesses dos pequenos mineradores durante o planejamento de fechamento. [11]

Empresas que atuam no segmento do ouro podem reduzir o impacto das mudanças climáticas e serem neutras em carbono

Embora a pegada de carbono do setor do ouro represente aproximadamente 0,4% das emissões anuais globais, as mineradoras podem adotar várias medidas econômicas para gerenciar o perfil geral de sustentabilidade.[12]

A mineradora de ouro canadense Mayfair Gold comprou compensações de carbono para 738tCO2e em emissões de GEE produzidas, tornando seu projeto de exploração de ouro Fenn-Gib neutro em carbono.[13]

O aproveitamento do potencial de descarbonização do ouro ampliará seu papel como um ativo seguro, um hedge, um diversificador de carteira e uma reserva de valor em um cenário de estresse no mercado.

O financiamento verde ganha popularidade no setor do ouro

Apesar da persistente incerteza geopolítica e econômica, a emissão global de títulos verdes, sociais, de sustentabilidade e vinculados à sustentabilidade (GSSS) superou a queda de 26% em comparação ao período anterior no mercado de renda fixa mais amplo, atingindo US$ 877 bilhões em 2022.[14]

Cada vez mais, as mineradoras demonstram apoio aos títulos verdes e outros títulos ligados à sustentabilidade, em meio à proliferação de fundos dedicados às metas ESG. Por exemplo, a Anglo American emitiu um título de € 745 milhões vinculado à sustentabilidade e ao seu desempenho na redução de emissões, na geração de empregos e na captação de água doce.[15]

O que impulsionará a resiliência do negócio no futuro?

Redes modernas e sistemas digitais integrados têm o potencial de proporcionar eficiência em toda a cadeia de valor

Atualmente, as mineradoras que operam no segmento do ouro utilizam tecnologias como Internet das Coisas (IoT, na sigla em inglês), sensores, veículos autônomos, drones e gêmeos digitais para aumentar a segurança, facilitar a prospecção de minas e estabelecer mecanismos preditivos. A adoção de ferramentas digitais modernas e sofisticadas pode melhorar a capacidade de monitorar processos e indicadores-chave de desempenho, criar um mundo físico virtual e dar suporte a decisões descentralizadas.

Recentemente, a Gold Fields implantou uma plataforma digital abrangente fornecida pela ABB na mina Granny Smith para unificar o planejamento, manutenção e produção, melhorar a produtividade e agilizar o fluxo de dados, de forma a permitir uma tomada de decisão em tempo hábil.[16]

Além disso, as mineradoras podem otimizar o uso de veículos autônomos com sistemas de rede eficientes. Por exemplo, as minas Detour Lake e Kittila da Agnico Eagle implementaram a rede sem fio 5G para aumentar a conectividade e a segurança.[17]

A transição para a conectividade da rede e para as energias renováveis pode reduzir a intensidade das emissões da energia utilizada na produção em 35% até 2030[18]

As mineradoras estão utilizando fontes de energia renovável para alimentar as minas e reduzir as emissões de GEE, a fim de combater as mudanças climáticas. As empresas que atuam no segmento do ouro encomendaram instalações eólicas e solares diretas para as operações. Por exemplo, espera-se que o comissionamento da nova usina solar de 16 megawatts (MW) e a infraestrutura adicional de armazenamento de bateria na mina Kibali da Barrick Gold aumentem o fornecimento geral de eletricidade renovável para a mina de 81% para 85%.[19]  

Além da adoção de fontes de energia renovável, as minas subterrâneas podem se beneficiar da eletrificação da frota para melhorar as condições de trabalho, reduzindo os níveis de ruído, calor e poluição. Além disso, os veículos elétricos oferecem custo-benefício de longo prazo para as mineradoras, com os impostos de carbono cobrados em todas as jurisdições.

Com o teor médio caindo para 1g/t, a extração econômica de minério com teor baixo será um diferencial potencial

O teor do minério das principais operações envolvendo ouro no mundo ficaram em 1,35 g/t em 2021, 8% abaixo do maior pico registrado em 10 anos, de 1,46 g/t em 2017, principalmente devido ao aumento dos preços e ao esgotamento das reservas com teor mais alto em minas maduras.[20]  Esses materiais com baixo teor se traduzem em altos custos para as mineradoras. As mineradoras podem empregar a lixiviação em pilha, que reduz os custos de recuperação de minérios de baixo teor, com menor uso de energia e água.


Resumo

Com o alto preço do ouro, as mineradoras estão focando em fusões e aquisições, atividades de exploração e metas de emissões líquidas zero. Métodos de extração de baixo custo e a adoção de inovações sustentáveis ajudarão as empresas do setor do ouro a melhorarem sua competitividade no longo prazo.

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