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Como os conselhos podem redefinir a resiliência estratégica em tempos de incerteza

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Descubra como os conselhos podem redefinir a resiliência estratégica, com foco em agilidade e governança para o sucesso organizacional de longo prazo.


Em resumo

  • Os conselhos precisam passar de uma resiliência reativa para uma resiliência estratégica, integrando-a aos processos centrais do negócio para garantir adaptabilidade e crescimento no longo prazo.
  • Ao enfatizar a colaboração e uma governança robusta, as organizações podem fortalecer sua resiliência por meio do alinhamento de estratégias entre áreas funcionais e stakeholders.
  • O aprendizado contínuo e o planejamento de cenários são essenciais para que os conselhos antecipem disrupções, permitindo respostas proativas e decisões bem embasadas.

A resiliência na agenda dos conselhos

O ambiente de negócios atual é marcado por mudanças rápidas, incluindo oscilações econômicas, tensões geopolíticas, disrupções tecnológicas e alterações regulatórias. Algumas dessas mudanças podem se tornar crises, enquanto outras impactam as atividades das empresas de forma previsível ou não, moldando seus resultados futuros.

Os conselheiros reconhecem os desafios desse cenário. Segundo pesquisa do EY Center for Board Matters, os conselheiros apontaram condições econômicas; estratégia de capital; inovação e tecnologias emergentes; cibersegurança e privacidade de dados; e mudanças regulatórias como as cinco principais prioridades dos conselhos para 2025.

Você tem poder sobre sua mente — não sobre eventos externos. Perceba isso, e encontrará força.

Com tantas incertezas, não surpreende que o conceito de resiliência esteja cada vez mais presente nas pautas dos conselhos. Tradicionalmente, resiliência é definida como a capacidade de responder a eventos disruptivos mantendo as funções essenciais. Em janeiro de 2025, o Fórum Econômico Mundial observou que as menções à palavra “resiliência” em teleconferências de resultados de empresas da Fortune 500 aumentaram mais de 200% em comparação com 2019, refletindo sua crescente importância nas estratégias corporativas.

Embora essas discussões frequentemente enfoquem a resposta a incidentes e a recuperação — principalmente após a pandemia de COVID-19 —, o cenário atual exige mais do que respostas reativas. O que os líderes estão adotando agora é uma abordagem mais holística e estratégica da resiliência, que permita à organização perceber e se adaptar para prosperar no longo prazo.

Enxergando pela lente da resiliência estratégica

A transição das práticas tradicionais de resiliência para uma abordagem estratégica em nível empresarial pode parecer apenas um ajuste simples, mas, na prática, representa uma mudança real na forma de pensar. Isso exige uma reestruturação dos processos, dos recursos, da governança e da cultura da organização.

Empresas que ainda estão nos níveis mais básicos de maturidade em resiliência costumam ter iniciativas isoladas para continuidade dos negócios e práticas desconectadas. Nesses casos, os esforços de resiliência ficam concentrados na área de TI e recuperação de desastres, e as interdependências entre setores não são bem compreendidas.

Um pouco mais avançadas estão aquelas que já têm uma estrutura um pouco mais organizada, com avaliações ocasionais de preparo e soluções tecnológicas ainda inconsistentes. Essas empresas conseguem reagir, se recuperar e retomar suas atividades em um nível aceitável para seus públicos de interesse, mesmo diante de grandes interrupções. Suas capacidades e processos podem até abranger continuidade e recuperação em diferentes áreas da organização.

No entanto, o foco principal dessas empresas e de suas lideranças ainda é simplesmente “voltar ao normal” após uma crise imediata. Isso limita a capacidade de transformar desafios em oportunidades e mantém a organização presa a um modo reativo e ineficiente, vivendo de crise em crise. 

Resiliência é tanto sobre aproveitar oportunidades quanto proteger contra riscos.

No setor financeiro, as práticas sólidas para fortalecer a resiliência incluem elementos operacionais, regulatórios e comerciais, com foco na continuidade das operações e na proteção dos clientes e da estabilidade do sistema. A resiliência estratégica amplia esse conceito para toda a organização, incluindo estratégia e vantagem competitiva.

Elementos-chave para o sucesso no longo prazo

A resiliência organizacional é essencial para garantir a sustentabilidade e o sucesso da empresa no longo prazo. As atividades e processos ligados à resiliência estratégica são elementos fundamentais (alguns até os consideram disciplinas) que fazem parte do contexto da organização. Os principais aspectos que destacamos para a liderança (adaptados da norma ISO 22316²) incluem:

  • Adaptabilidade: a capacidade de ajustar estratégias e operações diante de mudanças nas circunstâncias, dinâmicas do mercado e desafios inesperados, sem ficar preso a processos rígidos anuais ou plurianuais. No cenário atual de incertezas, onde as interrupções não seguem ciclos previsíveis, as organizações devem estar dispostas a revisar seus planos sempre que necessário. Por exemplo, entender os principais pressupostos que sustentam a estratégia da empresa e estar preparado para agir caso esses pressupostos não se confirmem como esperado.
  • Agilidade: a habilidade de perceber mudanças significativas com rapidez e tomar decisões ágeis, sem barreiras causadas por conflitos internos. Reduzir essas barreiras permite reagir rapidamente para evitar riscos ou aproveitar oportunidades. Um exemplo seria ter mecanismos para rever metas de liderança, garantindo que os líderes não sejam prejudicados ao tomar decisões que beneficiem a empresa no momento.
  • Governança robusta: a criação de uma estrutura de governança abrangente para apoiar iniciativas de resiliência em toda a organização, promovendo supervisão adequada, colaboração e comunicação. Por exemplo, ter um comitê de resiliência no nível executivo que faça relatórios periódicos ao conselho ou ao comitê de auditoria/risco.
  • Aprendizado contínuo: o compromisso com o aprendizado constante a partir de experiências — tanto acertos quanto erros — para melhorar as respostas e estratégias futuras. Isso inclui entender o que funciona e o que não funciona. Um bom exemplo são os "pré-mortems" ou "pós-mortems", que ajudam a prever ou analisar falhas sem punir quem aponta os problemas.
  • Engajamento dos stakeholders: a inclusão de pessoas relevantes — como colaboradores, clientes, fornecedores e investidores — no planejamento e, em alguns casos, nas decisões, para garantir diferentes pontos de vista e apoio nas ações diante de mudanças. Um exemplo seria aplicar pesquisas com fornecedores para identificar riscos que eles preveem.

Por trás de todos esses elementos está um foco no longo prazo, garantindo que necessidades operacionais imediatas ou metas trimestrais não distorçam decisões importantes que irão preparar a organização para um crescimento sustentável ao longo dos anos.

Não pensamos em trimestres. Pensamos em gerações.

Considerações para conselhos que supervisionam a resiliência estratégica

Como o conselho tem naturalmente uma visão voltada para o crescimento e a estratégia de longo prazo da empresa, ele está bem posicionado para apoiar e supervisionar a gestão na construção e manutenção da resiliência estratégica. Abaixo estão áreas nas quais o conselho pode atuar para orientar e acompanhar esses esforços complexos:

  • Alinhar a resiliência às prioridades da organização: entender as prioridades essenciais da empresa e os fatores que as sustentam (ou colocam em risco) permite direcionar os elementos mais críticos para criar resiliência. Isso começa pela cadeia de valor — o que gera receita e quais serviços são mais importantes para clientes e demais stakeholders. Com base nisso, os processos e funções essenciais do negócio passam a fazer parte da análise de resiliência. Isso também inclui os ecossistemas físicos e digitais necessários para entregar esses serviços, além de terceiros essenciais envolvidos nessa entrega. Diante de riscos críticos que ameaçam a cadeia de valor, é fundamental adotar uma estratégia de resiliência que esteja alinhada ao crescimento da empresa — não apenas reagir defensivamente aos problemas.
  • Explorar questões ocultas na tecnologia e na cadeia de suprimentos: casos recentes que impactaram empresas e ganharam destaque na mídia mostram que os conselhos precisam prestar mais atenção a vulnerabilidades críticas que antes não eram informadas. Exemplos incluem fornecedores essenciais e planos de contingência para os mais críticos. Avaliar o risco desses fornecedores com base no nível de dependência e no acesso que têm ao ambiente da empresa ajuda o conselho a ter uma visão mais clara. Outros pontos incluem prestadores de serviços de tecnologia que atuam nos sistemas da empresa sem testes ou aprovações independentes, e a robustez dos planos de continuidade de negócios. Para garantir que essas discussões ocorram no nível adequado, é provável que seja necessário revisar os critérios de medição e os protocolos de escalonamento usados nos relatórios ao conselho.
  • Enxergar o risco de forma dinâmica para acompanhar as mudanças: muitas empresas ainda apresentam relatórios anuais de riscos corporativos para os comitês de auditoria ou de riscos e para o conselho. No entanto, o cenário atual exige relatórios mais dinâmicos, que equilibrem a exposição a riscos e a prontidão da empresa. Assim como risco e oportunidade são dois lados da mesma moeda, risco e resiliência também estão conectados — afinal, resiliência representa o potencial de crescimento. Reavaliar riscos estratégicos e atualizar o conselho periodicamente mantém a empresa com uma postura preventiva e proativa. Muitos conselhos ainda se preocupam com o fato de a gestão de riscos ter se tornado um exercício de conformidade. Fazer atualizações ativas e frequentes transforma essa gestão em uma ferramenta real de resiliência, especialmente quando os planos são ajustados com base em análises atualizadas de eventos externos e causas profundas. Ter recursos e processos para monitorar continuamente o horizonte de riscos também ajuda a manter uma visão mais ágil e atualizada.
  • Orientar a gestão sobre os trade-offs apropriados: muitas vezes, decisões da equipe de gestão sobre alocação de recursos ou criação de redundâncias importantes são influenciadas por pressões para cortar custos e melhorar margens — e acabam nem chegando ao conselho. A resiliência envolve custos e benefícios que precisam ser mais bem compreendidos, para que o conselho possa orientar a gestão a fazer escolhas alinhadas à estratégia e ao apetite ao risco. Questionar as suposições da gestão faz parte do papel do conselho, principalmente quando se trata de decisões estratégicas. Além disso, é importante que o conselho entenda como certos incentivos e indicadores de desempenho focados apenas na redução de custos podem prejudicar a resiliência — por exemplo, ao penalizar líderes que implementam ações como criação de centros de gerenciamento de crises ou recursos redundantes. Ter uma estrutura de governança que eleve essas discussões é essencial para que o conselho exerça seu papel com eficácia.
Resiliência é como treinar para um triatlo: não dá para focar só em cardio. É preciso que vários grupos musculares trabalhem juntos.

Como medir o sucesso

As perguntas “O que significa ter sucesso?” e “Como medir o progresso em resiliência estratégica?” estão cada vez mais presentes nas discussões entre conselheiros. A resposta não está em um único indicador, mas sim em um conjunto de sinais que avaliem se os processos estão corretos, se os incentivos e recursos estão bem alinhados, e se há avanços reais na capacidade de adaptação e resiliência.

O modelo de inovação em resiliência apresentado a seguir oferece uma estrutura para identificar onde a organização está hoje e onde quer chegar. Cada empresa terá suas próprias prioridades — e nem todas buscarão atingir o estágio mais avançado de adaptabilidade dinâmica.

Para aquelas que se posicionam no quadrante superior direito desse modelo, a resiliência vai além da proteção contra riscos e passa a ser uma alavanca estratégica: em vez de apenas limitar perdas, essas empresas conseguem crescer explorando oportunidades que surgem a partir das próprias disrupções.

Em termos práticos, organizações com alta adaptabilidade possuem processos e tecnologias flexíveis, capazes de se ajustar conforme necessário, sem serem prejudicadas por barreiras internas ou conflitos.

Quadrant chart

Além deste framework para orientar discussões sobre a jornada de resiliência da organização, os conselhos e a gestão podem considerar uma variedade de práticas e medidas que fornecem indicações de progresso e ajudam a identificar problemas a serem resolvidos. Abaixo estão alguns exemplos para reflexão.

Cenários e análises do tipo "e se":
Uma das melhores formas de se preparar para uma crise é simular a situação e permitir que a organização aprenda antes dos eventos reais. O planejamento de cenários abrangentes, que consideram uma ampla gama de possíveis disrupções, oferece importantes oportunidades de aprendizado. Além disso, realizar pré-mortems ou pós-mortems permite uma análise mais profunda sobre o que deu errado ou poderia ter dado errado em situações específicas. A entrega de relatórios para o conselho dá aos seus membros a oportunidade de opinar, compartilhar suas perspectivas e lições aprendidas, além de permitir uma governança robusta.

Métricas operacionais e de processos:
Avaliar a eficácia da resiliência empresarial envolve revisar tanto os processos quanto os resultados. Os conselhos podem apoiar a administração no aprendizado contínuo sobre resiliência estratégica, focando no progresso, em vez de apenas análises pontuais, e observando o quadro geral dos sistemas, processos e suas interconexões e colaborações. Indicadores-chave de performance (KPIs) com métricas operacionais de tempos de resposta e taxas de recuperação podem ser complementados com informações adicionais, como a comunicação com fornecedores e terceiros e painéis de controle com dados em tempo real sobre disrupções potenciais. Para alguns, o estabelecimento de recursos permanentes de gestão de crises e mudanças — para monitorar constantemente o horizonte e trabalhar entre funções para impulsionar a implementação — será parte do processo global.

Indicadores de cultura e liderança:
Embora mais difíceis de medir, identificar como a cultura da organização e seu talento estão (ou não) defendendo a resiliência ajudará a determinar as necessidades de gestão de mudanças. Incentivar líderes a aprender com erros e quase-erros — e aplicar as lições aprendidas — marca uma diferença clara entre aqueles que são verdadeiros inovadores adaptativos em resiliência e aqueles que apenas reagem e se conformam. O aprendizado contínuo e o empoderamento dos funcionários podem ser viabilizados por meio de incentivos e boas estruturas de governança.

Em um mundo onde as organizações enfrentam a variabilidade e a velocidade de mudanças e disrupções de múltiplas fontes, as abordagens tradicionais do passado têm se mostrado insuficientes. Resiliência não é mais sobre apenas recuperar operações e serviços diante de uma crise ou falha — uma abordagem que mantém as organizações presas no modo de crise constante e lutando contra o último incêndio. Em vez disso, os líderes estão adotando uma mudança de mentalidade para a resiliência estratégica em nível empresarial. Isso permitirá que eles não apenas enfrentem os desafios da disrupção de maneira eficaz e eficiente, mas também avancem para aproveitar as oportunidades apresentadas com o realinhamento oportuno das atividades e pessoas da organização.

Perguntas para consideração dos conselhos

Para fomentar um entendimento mais profundo da capacidade de resiliência da organização, os conselhos podem refletir sobre:

  • Quais são as principais suposições e fatores importantes para nossa estratégia? Quão vulneráveis eles estão a mudanças inesperadas?
  • Estamos, como conselho, pedindo revisões de resiliência que vão além dos testes comuns de conformidade e controle?
  • Como a gestão prevê o que pode acontecer no futuro e como isso pode afetar a organização?
  • Como a gestão se prepara e resiste a ondas de mudanças inesperadas?
  • Como os líderes de negócios e das áreas estão colaborando, superando barreiras entre departamentos, para se preparar para mudanças e se tornarem mais fortes?
  • Onde o conselho percebe a influência de preconceitos implícitos e contextos que impedem a gestão de prever problemas?
  • As análises de cenários consideram uma variedade adequada de situações extremas e até mesmo improváveis, como um "ponto único de falha"?
  • As análises apresentadas ao conselho incluem os possíveis efeitos acumulativos de diferentes riscos?
  • Os planos de contingência e resposta para riscos significativos e de alto impacto são periodicamente simulados e revisados com o conselho?

Esta é uma tradução de conteúdo da EY Estados Unidos. A versão original, em inglês, está disponível em: How to reframe strategic resiliency in uncertain times.

Resumo

Redefinir a resiliência estratégica é essencial para os conselhos em um cenário de negócios incerto. A mudança de uma abordagem reativa para uma integrada é necessária, incorporando a resiliência aos processos centrais. Elementos-chave incluem adaptabilidade, agilidade, governança robusta e aprendizado contínuo. Ao promover colaboração entre áreas e envolver stakeholders, as organizações aumentam sua capacidade de lidar com disrupções. O planejamento de cenários e a tomada de decisões proativas sustentam o crescimento de longo prazo, permitindo que as empresas prosperem mesmo em ambientes voláteis.

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