"Empresa que não olhar para diversidade está fadada ao fracasso"

1 set 2021
Por Agência EY

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1 set 2021

Djalma Scartezini, consultor da EY, explica como o tema deve ser estudado e aplicado no ambiente corporativo

Os temas diversidade e inclusão serão imprescindíveis no mundo pós-pandemia e deverão fazer parte da pauta das empresas. “Uma empresa que não olhar para diversidade, equidade e inclusão está fadada ao fracasso”, afirma o gerente sênior de consultoria para Diversidade e Inclusão da EY no Brasil e América do Sul, Djalma Scartezini.

Há mais de 10 anos, Scartezini trabalha para que empresas brasileiras e multinacionais entendam e coloquem em prática ações sobre diversidade e inclusão no ambiente corporativo. “Ter uma cultura inclusiva deveria ser uma competência de cada colaborador e de cada líder, e não uma área com orçamento”, explica.

Formado em Psicologia, o consultor transformou sua deficiência em uma ferramenta para mudar o cenário das empresas. “Tinha consciência de minhas inabilidades físicas e motoras para certas atividades, mas nunca me percebi com menos competência cognitiva para poder chegar a qualquer posição. Essa segurança pessoal me permitiu crescer na carreira e batalhar por essas posições”, explica.

Nesta entrevista, Djalma Scartezini faz um panorama dos principais quatro pilares da diversidade (gênero, raça, pessoa com deficiência e LGBTQIA+) e mostra como a pandemia impacta nessas agendas.

Qual tem sido a principal pauta de diversidade?

As mortes de George Floyd, nos Estados Unidos, e de João Alberto, no Brasil, reacenderam a discussão racial. Esta se tornou a pauta principal da diversidade nas empresas, com os clientes colocando o tema globalmente pela força do “Black Lives Matter”. Estamos  vendo setores criarem programas de aceleração de carreira, como o de trainee do Magazine Luiza, ou de ações afirmativas que visam corrigir um histórico social. O problema é que, infelizmente, pode acontecer uma outra morte como a de Floyd.

Como a pandemia impacta a agenda de gênero?

Há impactos positivos e negativos. O lado positivo é que há uma revisão dos papeis dos casais heteroafetivos, por exemplo. A fala das mulheres tem mudado: “meu marido faz a parte dele” e não mais “ajuda”. Temos também rediscutido a importância da carreira do homem e da mulher. Ainda há uma série de premissas indicando que a carreira do homem é mais importante. O lado negativo dessa agenda é que aumentaram os casos de violência doméstica nos lares brasileiros e de feminicídio. 

Na questão de trabalhadores com deficiência, como o mercado está reagindo?

Entramos na pandemia com uma tensão gerada pela possibilidade de perda de direitos. Em dezembro de 2019, houve a tentativa de o governo federal extinguir a Lei de Cotas. Mas houve também uma decisão da Secretaria do Trabalho (Ministério da Economia) que impediu o desligamento de pessoas com deficiência até o fim de 2020. Isso ajudou uma série de empresas a manter as posições contratadas. Embora a lei não tenha sido renovada, temos visto que a maioria quer manter esse compromisso. O mercado está começando a sair dessa discussão da cota pela cota legal, unicamente por compliance, e a entender que, de fato, atrás desse profissional pode ter uma alta competência também.

 O home office influencia na contratação de pessoas com deficiência?

Há um aumento de contratação de pessoas com deficiência na pandemia. O gestor, quando tem de contratar, está protegido pela telinha do computador e não está vendo a deficiência. Não está se relacionando obrigatoriamente com a deficiência, não tem de se preocupar, por exemplo, com a ida e volta do trabalho desse funcionário, ou como será o almoço. Vemos menos receio de contratação. Esperamos que, quando voltarem para o modelo híbrido, seja qual for a frequência semanal, as empresas não deixem de contratar porque, acima de tudo, incluir é entrar em relação ou ter a pré-disposição para entrar em conexão com as pessoas.

Como as empresas estão atuando na agenda LGBTQIA+? 

Os temas são trazidos a público com maior facilidade, mas os direitos são conquistados e ameaçados o tempo inteiro. A gente vê projetos de lei tentando proibir um casal homoafetivo em uma propaganda de televisão e CEOs se posicionando que as marcas são inclusivas. Vivemos em um momento de contrastes em que as pessoas clamam por posicionamento. Os casos de assédio moral e homofobia em geral aumentaram. Existe uma sensação de que no virtual pode tudo. As empresas estão muito atentas. Trabalhar a diversidade também significa tratar os temas e definir o que não gostariam em termos de comportamentos. Os funcionários entram pelo LinkedIn e vão embora pelo seu Facebook ou Instagram. O comportamental é cada vez mais valorizado.

Dessas agendas, qual está mais avançada nas empresas? 

A mais antiga e madura é a de gênero. Já se discute há muito tempo a questão da carreira da mulher e a sua posição em cargos de liderança. Várias empresas colocam metas para serem cumpridas em 3 a 5 anos e conectadas, inclusive, aos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) da Organização das Nações Unidas (ONU). Ainda é preciso fazer uma quebra cultural importante de que a mulher não pode ter um cargo mais complexo de gestão se tiver filhos e marido. Essa é a premissa que está por trás. 

A agenda de pessoa com deficiência é a segunda mais madura porque está em discussão há cerca de 20 anos, e há um dispositivo legal que tem multado drasticamente as empresas de todos os setores que não cumprem a cota. 

A racial é a que deveria ser a agenda prioritária, na minha opinião. Por conta da morte do George Floyd, as empresas acordaram e lançaram seus programas de diversidade ou estão investindo mais fortemente. A LGBTQIA+ tem caminhado e acho que ela dá alguns saltos e reage muito fortemente à maneira como o mercado se coloca.

 Na sua opinião, o que a empresa que decide investir em diversidade e inclusão precisa? 

O trabalho de diversidade vai começar com um grande diagnóstico dessa empresa, de uma foto de como ela está. Uma coisa é o que a empresa fala para fora. Outra é o que de fato as pessoas percebem o que está sendo falado. E aí entra minha segunda recomendação: antes de falar para fora, olhar dentro de casa. Além disso, é preciso governança de um programa com estrutura para ter avanço, foco, investimento e metas. Tem de ser uma meta factível para poder comemorar cada uma das vitórias. E como se constrói a cultura? Com uma trilha de capacitação permanente. Ter uma cultura inclusiva deveria ser uma competência de cada colaborador e de cada líder e não uma área com orçamento, investimento e meta puxando e apertando para que uma empresa vire essa cultura específica. Ainda tem um tempo de maturação para chegar lá.

Em termos de inclusão, como você imagina o pós-pandemia nas empresas? 

O advento do ESG (ambiental, social e de governança) entrou na pauta fortemente no meio da pandemia e veio para ficar como um novo marco regulatório, uma nova régua que vai dizer como as empresas têm de operar. Está muito claro como as multinacionais enxergam o que precisam fazer para construir um mundo de negócios melhor. Não dá para negligenciar essas três letrinhas e a diversidade vai pegar carona nesses temas. Arrisco a dizer que uma empresa que não olhar para diversidade, equidade e inclusão está fadada ao fracasso.

 Como a sua deficiência ajudou na construção da sua carreira e no seu trabalho? 

Eu não pensava que isso era relevante para as pessoas porque acredito, de maneira bem clara, que sou uma pessoa privilegiada e que não sofre um terço do que as pessoas sofrem. Olhando para o meu lugar de estrutura mesmo. No Brasil, o acesso às coisas tem a ver com o poder aquisitivo e não com meritocracia. O local de nascimento garante acesso à estrutura social e econômica de classes. Sou uma pessoa que nasceu na classe A/B, com um pai médico que fez o meu parto. Nasci de cinco meses e, se não tivesse sido meu pai, eu não estaria aqui. Tive uma série de privilégios de acesso. Mas o que impactou e virou motor é que sempre fui a única pessoa em todos os lugares em que estudei, trabalhei e circulei que tinha algum tipo de deficiência. Isso era estranho por um lado e positivo por outro. Eu tinha consciência de minhas inabilidades físicas e motoras para fazer certas atividades, mas nunca me percebi com menos competência cognitiva para poder chegar a qualquer posição. Essa segurança pessoal me permitiu crescer na carreira e batalhar por essas posições.

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Resumo

Djalma Scartezini, consultor da EY, explica como o tema deve ser estudado e aplicado no ambiente corporativo.

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