Foto de José Luiz Vidal

EY entrevista: José Luis Vidal

Especialista em logística e transportes, atuante nos setores de mineração, petróleo e gás, o conselheiro e empresário José Luis Vidal ressalta a importância das empresas terem um Conselho de Administração de perfil diverso e preparado para enfrentar as transformações no clima.

Engenheiro eletricista paulistano, formado pelo Instituto Mauá de Tecnologia, José Luis Vidal, tem uma série de especializações: economia global, administração de negócios, liderança em inovação, gestão de riscos e decisões financeiras, além da clássica formação para conselheiros e conselheiras do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).

Aos 58 anos, ele é adepto da educação continuada e conta que foi para o Massachusetts Institute of Technology (MIT) “não só para fazer um curso, mas principalmente para conviver com gerações mais jovens”, para entendê-los e conseguir se aproximar de novas realidades, valores e crenças, de forma a estar mais apto a aconselhar com propriedade sobre cultura organizacional envolvendo as novas gerações do mercado de trabalho.

Ele fez carreira como executivo nos setores de infraestrutura, transporte e mineração, e está há 13 anos no Conselho de Administração da mineradora Bemisa, há seis anos no Conselho da empresa de logística Santos Brasil, e recentemente cumpriu um mandato de dois anos na Braskem. Também foi conselheiro consultivo de uma série de empresas e associações.

Na Fundação Getulio Vargas, Vidal integra os Comitês de Regulação de Portos e de Ferrovias, e é professor convidado de Governança e Compliance no MBA de Gestão Portuária. É cofundador e presidente do Conselho da Associação Nacional das Ferrovias Autorizadas (ANFA).

Há 24 anos, tornou-se empresário enquanto estava em tratamento de um tumor na medula e com sua filha recém-nascida. Tem uma história de vida intensa, chegou a levar três tiros e ser sequestrado. Apaixonado por sua família, conta que ter sua esposa como amiga, parceira e sócia faz grande diferença no seu dia a dia. Assim como os ensinamentos que recebeu de sua mãe, falecida há cinco anos, “uma cearense de 1,5m de altura, de família muito simples, que trabalhou para a família Lunardelli, referência na sociedade brasileira, durante 49 anos”. Veja mais na entrevista a seguir.

1. Como foi a sua jornada até se tornar membro de Conselho de Administração?

Eu passei por algumas empresas significativas, como a Ferrovia Centro-Atlântica, que inicialmente, era uma sociedade da Vale com o GP Investimentos. Depois, a Vale comprou a parte do GP e eu fiquei como Vale, e mais tarde passei a representar a Vale em uma joint venture com a Pasha, uma empresa de logística muito grande nos Estados Unidos, para avaliação de implementação de uma empresa de logística na América do Sul, era a Rio Doce Pasha Terminais. A Vale depois vendeu sua parte, e fui convidado pela Pasha para abrir a Pasha Brasil. Depois de alguns eventos, outras joint ventures, fusões e aquisições, a Pasha decidiu encerrar as operações dela no Brasil e pediu para eu encerrar a empresa no país.

Foi a grande virada da minha carreira. Eu tinha uma filha de nove meses, tinha descoberto um tumor na medula. Esperei pelo meu tratamento e fiz uma proposta de encerrar a empresa e dar continuidade aos negócios que estavam em andamento, abrindo minha própria empresa. Coloquei o nome da empresa de WV Logistics, sendo que a Pasha passou a ser meu primeiro cliente, em função de negócios que ainda estava em andamento, porém, a partir daquele momento eu passaria a atuar com eles e para eles, através da minha empresa.

No momento seguinte, a Geodis, uma empresa de logística que pertence ao sistema ferroviário francês, estava buscando um parceiro no Brasil. E aí eu virei o parceiro exclusivo da Geodis no Brasil para projetos industriais, essa empresa gigantesca, que é um dos cinco maiores operadores logísticos internacionais. Depois de algum tempo, eu fui convidado também pelo banco Opportunity para ser diretor de logística, e ajudei a fundar a mineradora Bemisa, onde fiquei por dois anos. Quando chegou um novo CEO, fiz um acordo com ele, e coloquei a minha empresa para atender todos os aspectos de logística e infraestrutura da Bemisa. Assim que passei a ser conselheiro, em março de 2011. E sigo até hoje, são 13 anos e três meses como conselheiro na Bemisa.

Eu prestava serviço para a mineradora Rio Tinto através da minha empresa, e o presidente da Rio Tinto no Brasil me indicou fazer o curso do IBGC em 2012. Fiquei uma semana imerso, oito horas por dia me preparando. Esse crescimento, enquanto conselheiro, fez com que o Opportunity me convidasse a fazer parte do Conselho de Administração da Santos Brasil, onde estou indo para o quarto mandato.

Eu acabei de encerrar um mandato na Braskem, onde fui indicado pela Petrobras e passei por um processo de headhunter internacional. Foi um Conselho que me deu uma bagagem muito grande, porque é muito robusto, uma empresa presente em vários países. E eu sempre procurei, de forma paralela, ter o que o IBGC indica, que é o lifelong learning (educação continuada).
 

2. Hoje em dia, quais os temas que você dedica a maior parte do tempo enquanto conselheiro?

Gestão de risco, transição energética, clima e infraestrutura. Por causa da minha história na área de ferrovia, porto, infraestrutura, eu tenho realizado operações através da minha empresa no Porto de Houston há mais de 15 anos. Sendo que o diretor do Porto de Houston virou presidente da Câmara de Comércio Brasil-Texas, a BRATECC, e me convidou para ser conselheiro consultivo e fundar o Comitê de Mineração e Infraestrutura.

Houston é a capital energética no mundo, por causa da quantidade de petroleiras.  O Porto de Houston adotou a sigla ES²G, para ressaltar além do social, a segurança de tudo – do trabalho, das pessoas, a segurança ambiental, a segurança social. Desde 2022, eu venho discutindo muito sobre clima nos Estados Unidos. Inclusive recebi o ex-prefeito de Houston, Silvester Tuner, quando ele veio ao Brasil, em 2023. Ele coordena o grupo de prefeitos dos EUA, o qual discute o processo de mudança climática global.

Em 2023 fui aos Estados Unidos indicado pelo ministro Augusto Nardes, do TCU, que discute sobre clima com o mundo todo, para abordar pontos que poderiam ser sinérgicos para a discussão do clima. Hoje a gente vê o quanto o clima está afetando os negócios e as questões de transição energética, clima e infraestrutura estão no centro de tudo. A necessidade de sair a Ferrogrão é de redução de carbono (projeto de ferrovia de 933 km na Amazônia, conectando a região produtora de grãos do Mato Grosso ao estado do Pará).  Como sou o presidente do Conselho da Associação das Ferrovias Autorizadas - ANFA, eu discuto isso de forma muito clara com autoridades e ferrovias americanas.

Em nome do CEO da BEMISA, acabei de convidar Jane Stricker, vice-presidente sênior de Transição Energética e diretora executiva da Iniciativa de Transição Energética de Houston e da Greater Houston Partnership, a fazer parte do comitê de ESG. Ela é uma das profissionais mais reconhecidas no setor de energia de Houston, cidade que é o centro da discussão sobre transição energética global.

Sou consultor da Norsk Hydro do Brasil S. A., uma das maiores empresas de alumínio do mundo. Ela tem uma planta em Barcarena (no Pará), e fez a maior transição energética este ano no Brasil. Era a maior compradora de combustível da Petrobras no Brasil e fez a transição para o GNL (gás natural liquefeito).

Como conselheiro na Braskem, eu era do Comitê de ESG e nos últimos anos a gente buscou entender, entre outros aspectos, quais seriam os melhores processos para a cadeia circular do plástico e de diminuição das emissões de CO2.

3. Quais os aspectos mais importantes que membros de Conselhos precisam saber sobre transição energética nos setores de infraestrutura, transportes, mineração, petróleo e gás?

Eu não acredito na transição energética por completo, mas na adequação da matriz energética. Não será possível substituirmos na plenitude a utilização do combustível fóssil. A sociedade busca sim, por diminuição das emissões de CO2 e isto pode ser feito através de uma otimização da utilização de combustíveis renováveis, onde couber. Então, a busca e forma adequada e sustentada pelo balanço da matriz energética será o mais adequado e isto acontecerá de acordo com as diferentes realidades ambientais, socioeconômicas e regulatórias.

Nesse momento, a Eletrobras tem excedente de energia elétrica, mas será que vai ser sempre assim? Será que se a gente colocar solar 100% vai ser adequado? Todo mundo está falando em hidrogênio. A Europa está voltando a falar em nuclear. Então, a análise adequada do uso e do balanço da matriz energética é muito importante.


4. Como membros de Conselho de Administração podem se preparar para aconselhar a alta gestão das empresas para a prevenção de riscos e redução de danos em eventos climáticos extremos, como a inundação que afetou o porto e o aeroporto de Porto Alegre e alagou nove a cada dez fábricas do Rio Grande do Sul, e também a previsão de nova seca severa no Amazonas?

Estamos falando de ativos de infraestrutura, os quais estão relacionados a investimentos de grande monta e intensidade. O Brasil passa por um planejamento estratégico de infraestrutura que, em função de suas características, tem um longo período de execução, implementação e amortização dos montantes investidos. Temos enfrentado nos últimos 20 anos, diferentes planos que não se concretizam, pois estão sempre relacionados a Políticas de Governo, que mudam de 4 em 4 anos, e não de Estado. Isto fragiliza a segurança jurídica e diminui o apetite dos investidores internacionais.

Na sua maioria, os Conselhos de Administração têm muita gente de finanças, pela crença de que administrar uma empresa é a parte financeira que lidera. O dia a dia está mostrando a importância de se ter conselheiros mais próximos da realidade operacional da empresa. Como um conselheiro vai poder falar de gestão de risco de um negócio que ele não conhece profundamente? Eu não estou dizendo que o Conselho tenha que ter na sua maioria pessoas do mercado relacionado àquela indústria, porque é bom você ter cabeças totalmente diferentes, de origens diferentes, mas você tem que ter no mínimo um conselheiro que conheça a realidade da infraestrutura e agora, os impactos que as novas realidades relacionadas ao clima, inclusão, diversidade entre outros  irão impactar no curto prazo e de forma direta/indireta os diferentes negócios.

A Covid-19 acelerou o processo de transformação digital na vida das pessoas e nas empresas. Por tal, a busca por profissionais de TI gerou um aumento desequilibrado entre oferta e procura. Da mesma forma, as frequentes transformações no clima, na minha opinião, vão gerar a necessidade de profissionais que conheçam infraestrutura e seu impacto nos diversos negócios.

 

5. Você teria indicações culturais ou fontes de conteúdo que julgue relevante para auxiliar seus pares a refletir acerca dos desafios da posição de conselheiro? 

Eu acho que é preciso ter um network que se retroalimenta. Você aprende muito com seus pares quando você está disposto e aberto. Valdecyr Gomes e Marcelo Klujsza, por exemplo, estão entre os que me agregam valor.

Eu particularmente procuro muito a realidade das universidades de primeira linha, nos Estados Unidos, na Europa. Normalmente faço de um a dois cursos por ano, presencial ou online, porque isso me traz para a realidade acadêmica, que acho muito importante, porque eles pensam de forma diferente. Eu fui para o MIT não só para fazer um curso, mas principalmente para conviver com gente muito mais jovem, que eu queria entender. Eu tenho uma filha de 24 anos, quase 25, e eles pensam de maneira totalmente diferente, os valores são diferentes, tudo é diferente. Eu fui para tentar entender isso. Então, se você quiser ser um conselheiro, você vai ter que entender a cabeça dessa nova geração, a realidade deles.

Como a gente satisfaz as necessidades dessa nova geração sem perder os valores da empresa? Como você gera a cultura da empresa com todo mundo trabalhando em casa? Essas coisas têm que ser discutidas de maneiras mais profundas. Não é simplesmente “agora é tudo home office”. Você não cria a cultura da empresa com gente em casa. Você tem que encontrar uma maneira de atraí-las para o escritório, para que esse convívio volte a ser importante. Porque hoje está todo mundo casando-se com o celular. A gente vai ter que encontrar o equilíbrio de tudo isso. Minha mãe dizia que a verdade está no meio, não nos extremos. A gente tem que buscar essa verdade em todos os processos, tanto de relação pessoal como de relação profissional.

Eu gosto muito do informe que recebo da EY sobre as Prioridades dos Conselhos de Administração, algumas outras entidades também fazem. São conteúdos muito importantes para quem vive essa realidade de conselheiro. É um material que se você não ler e procurar também pesquisar em volta dele, você não o traduz com tanta facilidade. Acredito que essa deve ser uma prática habitual de quem quer ser conselheiro.

Resumo

O EY Center for Board Matters (CBM) entrevistou José Luis Vidal. Especialista em logística e transportes, atuante nos setores de mineração, petróleo e gás, Vidal falou sobre a importância das empresas terem um Conselho de Administração de perfil diverso e preparado para aconselhar a alta gestão sobre adequação da matriz energética e as consequências das transformações no clima na infraestrutura e seu impacto nos negócios.

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