An empathetic female counselor listens as a vulnerable patient shares about a difficult situation.

Como transformar os modelos de atendimento para oferecer melhores cuidados com a saúde mental

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Nova pesquisa da EY destaca quatro áreas de foco em que as organizações de saúde podem melhorar o acesso à saúde mental, a experiência e os resultados.


Em resumo

  • Entrevistas com executivos globais da área de saúde revelam que a coleta inadequada de dados sobre saúde mental inviabiliza a concretização de muitos dos esforços para a extração de percepções acionáveis.
  • Os executivos da área de saúde querem ver mais consistência na prática do cuidado com a saúde mental e uma mudança no foco dos investimentos, do atendimento agudo para a prevenção.
  • A transformação digital da saúde é a chave para aprimorar o atendimento em saúde mental, fornecendo percepções mais precisas a partir de dados e promovendo um ecossistema de atendimento integrado.

Quase metade (49%) dos entrevistados da Pesquisa Global de Saúde do Consumidor 2025 da EY classificou o sistema de saúde mental em seu país como regular ou ruim – uma percepção significativamente pior do que a do sistema de saúde geral. Em entrevistas marcantes, até mesmo os executivos da área de saúde compartilharam suas próprias dificuldades para garantir atendimento adequado de saúde mental a familiares próximos.

"Não consigo acreditar no número de ligações que recebo de pessoas, até mesmo de estranhos, que dizem: 'minha filha ou meu filho está realmente passando por dificuldades'", relatou um executivo de saúde global.

Em todo o mundo, longos tempos de espera para serviços de saúde mental não são incomuns, o que contribui muitas vezes para o agravamento dos sintomas e aumento de casos de crise no pronto-socorro. "Em geral, os investimentos são prioritariamente direcionados para o cuidado agudo — mais leitos, mais atendimento a crises. Mas não faz muito sentido continuar financiando ambulâncias no fundo do rio, sem investir rio acima", disse Chloe Jesson, diretora executiva adjunta da Queensland Alliance for Mental Health, na Austrália. "Precisamos priorizar não apenas a intervenção precoce, mas também o apoio às pessoas antes que elas entrem em crise. Se nos concentrarmos apenas no atendimento agudo, continuaremos a ver pessoas sendo puxadas para correntes perigosas. Em vez disso, devemos investir consideravelmente para diminuir o fluxo e oferecer o atendimento certo no momento certo."

A nova pesquisa da EY destaca um caminho a seguir para proporcionar melhores resultados e experiências por meio de um sistema que desmistifique a jornada, seja mais transparente em relação aos custos e resultados e ajude a conectar as pessoas aos prestadores de serviços certos no momento ideal durante o atendimento. Quase todos os especialistas em saúde entrevistados afirmaram que uma melhor coleta de dados e percepções são essenciais para ajudar os países a entender as necessidades de saúde mental da população e dos indivíduos, para que possam intervir de forma mais eficaz e avançar em direção a um atendimento mais baseado em medições.

Stakeholders impacientes não estão vendo o valor

Por outro lado, os sistemas de saúde não convenceram totalmente seus consumidores sobre o valor da prestação de serviços de saúde mental - um em cada três (33%) entrevistados na pesquisa da EY disse que pode cuidar do problema sozinho, enquanto outros 17% disseram que a ajuda profissional não funciona.

dos entrevistados acreditam que podem resolver o problema sozinhos.
dos entrevistados não acreditam que o apoio profissional ajudaria.

O ceticismo pode ser atribuído à própria jornada, pois os consumidores se dizem confusos sobre como entrar no sistema. Mais de um terço afirmou não ter certeza sobre como encontrar apoio ou acha as informações sobre saúde mental difíceis de entender.

Nossas descobertas mostram que os consumidores são desafiados pelo acesso, por barreiras culturais e por não entenderem que tipo de atendimento precisam, seja um psicólogo que possa oferecer terapia de conversação, um psiquiatra que possa prescrever medicamentos, um conselheiro de pares ou alguém intermediário. Questões financeiras e falta de transparência sobre os custos também são uma grande preocupação. Então, como as organizações de saúde podem começar a transformar o atendimento?

1. Melhorar a coleta e a análise de dados de saúde mental para obter resultados melhores e mais equitativos.

De acordo com os executivos entrevistados, a qualidade da coleta de dados, que já é limitada no sistema de saúde tradicional, é ainda mais inadequada em relação à saúde mental. Como resultado, as organizações de saúde muitas vezes não têm uma noção real das necessidades de sua população e os insights necessários para intervir proativamente em nível individual.

Sem essa infraestrutura de dados, as organizações de saúde não conseguem aplicar ferramentas básicas de análise ou inteligência artificial (IA) para obter insights sobre a demanda e as necessidades dos pacientes. A construção dessa infraestrutura deve ser orientada por políticas de governança que reconheçam os regulamentos específicos de privacidade de dados de saúde e saúde mental, e que determinem como usar os dados de forma a garantir confiança. Ao integrar sistemas e aplicar a IA, essa governança será importante para evitar preconceitos ou alucinações que possam acentuar os desafios já existentes.

A pesquisa também constatou que os consumidores globais estão abertos a ferramentas digitais que possam ajudar na saúde mental, desde que as organizações de saúde sejam transparentes e os ajudem a ver o valor do uso de tecnologias digitais para conectá-los a provedores, grupos de colegas e outros suportes. Sessenta por cento dos entrevistados afirmam que se sentiriam à vontade para usar testes genéticos que mostram a predisposição a determinadas condições de saúde mental; 59% se sentiriam à vontade para usar tecnologias digitais que coletam e compartilham seus dados de saúde mental com os provedores. As organizações de saúde precisam incorporar a privacidade e a segurança em todo seu projeto de infraestrutura de informações, aplicativos e algoritmos. Os pacientes querem ter a certeza de que seus dados são criptografados de ponta a ponta e que permanecerão restritos aos sistemas para os quais autorizaram o acesso.

2. Transformar os modelos de atendimento para melhorar a triagem, aumentar a prevenção e a integração.

As entrevistas e os resultados da pesquisa destacam as barreiras de acesso ao atendimento oportuno de saúde mental, e essas barreiras podem resultar em ineficiência e desperdício. Quando as pessoas não são encaminhadas adequadamente, muitas evoluem para uma situação de crise, concentrando os recursos do sistema em leitos de internação e cuidados agudos. Enquanto isso, problemas que poderiam ser previamente resolvidos com menos sofrimento, custo e ônus para o sistema ficam sem solução.

Os entrevistados da pesquisa global disseram que estão abertos a cuidados preventivos de saúde mental. Oito em cada 10 entrevistados (81%) indicaram que fariam um exame anual de saúde mental se ele fosse oferecido sem custo ou a um custo mínimo, um pouco abaixo da porcentagem que afirmou que faria exames preventivos anuais de saúde física, como exames de sangue (87%).

Os líderes da área de saúde também expressaram o desejo de maior padronização na prestação de cuidados com a saúde mental, como tem sido feito clinicamente com doenças como pressão alta e diabetes. "Temos diretrizes de prática clínica realmente focadas no atendimento e apoio para que os médicos e as equipes de atendimento primário possam avaliar, identificar, fazer a triagem e, em seguida, decidir e iniciar o tratamento com vias claras de escalonamento para as pessoas", disse o Dr. Sacha Bhatia, vice-presidente de atendimento primário e comunitário da Ontario Health no Canadá. "Não temos isso da mesma forma com a depressão e a ansiedade, e isso é fundamental." 

As entrevistas destacam a capacidade das equipes integradas de saúde mental em oferecer o nível certo de atendimento quando os consumidores precisam, aumentando e diminuindo o atendimento, especialmente quando muitos dos que estão passando por dificuldades não sabem do que precisam. Em todo o mundo, os sistemas de saúde se voltaram para diferentes modelos integrados que reúnem a atenção primária, a saúde mental, a saúde sexual e outros prestadores de serviços sob o mesmo teto.

A pesquisa sugere que os prestadores de serviços de saúde podem ser um ponto de entrada para o sistema de saúde mental, com 61% dos consumidores já buscando ajuda de seu prestador de serviços de saúde primária para problemas de saúde mental. Quase 70% dos entrevistados disseram que se sentiam muito ou um pouco à vontade para tratar de saúde mental com seu médico de atenção primária, sendo que as gerações mais velhas têm maior probabilidade de ter um médico e de se sentir à vontade com ele. No entanto, para aproveitar essa oportunidade, seriam necessárias plataformas de dados integradas e um ecossistema mais coordenado com foco na prevenção.

Os pagadores e os governos têm um papel a desempenhar no incentivo a uma mudança para um atendimento de saúde mental mais preventivo, preditivo e acessível que ofereça consistência na qualidade do atendimento. "Eventualmente, o que impulsiona a inovação é o reembolso. Enquanto as companhias de seguros não perceberem os bloqueios, não avançaremos", disse Luisa Wasilewski, fundadora da Pulsewave Digital, sediada em Berlim, na Alemanha. "São os reguladores que mudam o sistema, não a tecnologia."

Outro caminho digital a ser seguido pelas organizações de saúde é a criação de portas de entrada digitais intuitivas e úteis por meio de portais on-line ou aplicativos que ajudem a tornar a experiência de atendimento à saúde mental melhor e mais eficaz, conectando-os ao atendimento quando necessário e esclarecendo como obter ajuda.

3. Mostrar valor e progresso aos consumidores, pagadores e stakeholders.

Mais da metade dos entrevistados (55%) relatam que questões financeiras ou de seguro os levaram a parar ou considerar parar de usar serviços profissionais de saúde mental. Para fazer frente às preocupações econômicas e ao ceticismo em relação ao valor do tratamento de saúde mental, as organizações de saúde poderiam obter ganhos investindo na educação dos consumidores e stakeholders, ajudando-os a entender as decisões de tratamento e o realismo do progresso.

Kirsten Horthe, chefe da unidade psiquiátrica do Vestre Viken Hospital Trust, na Noruega, destacou como sua organização usa a tecnologia para ajudar os pacientes a entender seu progresso. Por meio de um programa chamado "Share with Me" (Compartilhe comigo), a equipe disponibiliza ao paciente, antes e durante o tratamento, um formulário que fornece um feedback consistente sobre seu progresso. "Se o paciente sente que não está havendo progresso, isso é comunicado ao terapeuta", explica ela. "É uma forma inteligente de usarmos a tecnologia para melhorar, aos poucos, a sistematização do feedback. Caso contrário, a sala de terapia se torna um espaço fechado. Se algo vai mal, não é possível saber se o terapeuta está adotando as abordagens corretas. Quando, por meio desses formulários, surgem sinais de alerta, como indicativos de ideação suicida, o sistema permite uma escalada da atenção e a oportunidade de intervir mais cedo." 

A falta de um atendimento baseado em medições prejudica a capacidade dos provedores de convencer os consumidores e os pagadores de que os serviços de saúde mental são valiosos. E outros stakeholders apontam para a falta de responsabilidade quando se trata de oferecer resultados de qualidade em saúde mental.

Sem dados, os provedores também têm tido dificuldades para mostrar aos pagadores o valor desses serviços. "Os pagadores querem ter um ROI, mas a realidade é que a prestação de serviços de saúde mental carece de estrutura, responsabilidade, mensurabilidade e transparência há muito, muito tempo", disse Brad Kittredge, fundador e CEO da Brightside Health, um provedor on-line de serviços de saúde mental. "Com doenças cardíacas ou diabetes, os provedores podem mostrar resultados muito mais rigorosos. Há muita ciência por trás dos cuidados com a saúde mental, apesar das decisões subjetivas que às vezes são tomadas", disse ele.

4. Investir nas áreas em que os consumidores apontam falhas significativas por parte das organizações de saúde.

A pesquisa sugere que os consumidores estão sobrecarregados de informações e não sabem de que tipo de provedor precisam. Eles lutam para ter acesso ao atendimento em tempo hábil e para entender seus custos financeiros, resultando em desigualdades.

Um terço dos entrevistados globais (32%) citou a falta de profissionais de saúde mental com habilidades específicas para suas necessidades; 50% dos que usaram serviços de saúde mental mudaram de profissional de saúde mental, sendo os principais motivos a falta de conexão pessoal ou de compatibilidade (42%) ou insatisfação com o progresso (37%).

A pesquisa da EY com consumidores destaca os momentos da jornada de saúde mental em que as organizações têm maior oportunidade de melhorar as interações que os consumidores consideram mais importantes, e também as mais difíceis. São eles:

  • Saber por onde começar a procurar ajuda para minha saúde mental;
  • Saber que tipo de profissional de saúde mental procurar;
  • Obter atendimento em tempo hábil quando necessário;
  • Escolher o tipo certo de profissional que se alinhe às minhas necessidades;
  • Encontrar serviços que eu possa pagar;
  • Ser claro quanto aos custos diretos;
  • Sentir que os cuidados com a saúde mental são acessíveis;

Principais conclusões

Projeções apontam que metade da população global desenvolverá um ou mais transtornos mentais até os 75 anos de idade. Após a pandemia da COVID-19, países de todo o mundo declararam situação de crise diante do aumento nos índices de depressão, solidão, ansiedade e outros desafios enfrentados por jovens e adultos. Nos EUA, o número de adolescentes que compareceram ao departamento de emergência por tentativas de suicídio aumentou em quase um terço com o início da pandemia. Os sistemas de saúde têm sido desafiados a acompanhar a demanda — na Austrália, 71% dos clínicos gerais relatam que as preocupações relacionadas à saúde mental estão entre os três principais motivos de visitas ao consultório, enquanto o agendamento de uma primeira consulta com um psiquiatra pode levar meses.
 

A falta de investimento mundial em cuidados preventivos de saúde mental não significa que a sociedade está escapando desses custos. Para ilustrar o preço invisível, os custos sociais para apenas um Estado (Indiana) nos EUA foi estimado em US$ 4,2 bilhões por ano para doenças mentais não tratadas.
 

Qualquer pessoa que tenha acompanhado uma crise de saúde mental de um filho ou ente querido sabe como isso pode ser aterrorizante e confuso em relação a saber aonde ir, em quem confiar, o tipo de ajuda necessária, quanto custará e se funcionará. Após a pandemia, os custos para a sociedade, para as famílias, para os provedores e para os sistemas de saúde são evidentes. O caminho a seguir é uma jornada de cuidados com a saúde mental mais eficaz, transparente, preventiva e acessível.

Resumo

Os futuros modelos de atendimento à saúde mental dependerão de dados abrangentes sobre seus pacientes e populações para oferecer o atendimento que os consumidores desejam. Esse atendimento será acessível quando e onde for necessário, fácil de navegar, eficaz e econômico.

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