Artigo: Taxonomia Sustentável Brasileira busca reorientar investimentos e financiamentos

28 jan 2025

Por Leonardo Dutra, sócio-líder de Climate Change and Sustainability Services da EY Brasil; Lucas Baruzzi, gerente de Climate Change and Sustainability Services; e Lara Vitale, analista de Climate Change and Sustainability Services

Estão em consulta pública os critérios de classificação das atividades econômicas com impactos ambientais, climáticos e sociais positivos, permitindo uma tomada de decisão qualificada por parte de investidores e financiadores públicos e privados. Uma taxonomia sustentável é um sistema de classificação que define critérios para identificar quais atividades econômicas podem ser consideradas sustentáveis. Trata-se de uma mudança de paradigma, em que a regulação define o que é sustentável – ao contrário do usual, em que as companhias declaram o que é sustentável em suas práticas.

Assim, a taxonomia serve como uma ferramenta para orientar os fluxos de financiamentos e investimentos públicos e privados, permitindo que tomadores de decisão qualifiquem suas decisões, direcionando recursos para atividades que contribuam para a mitigação e adaptação às mudanças climáticas, para a redução das desigualdades sociais, de gênero e de raça e para a proteção dos recursos naturais e da biodiversidade – aspectos detalhados adiante.

A taxonomia da União Europeia, publicada em 2020, foi pioneira nesse movimento e, desde então, países como Canadá, Reino Unido, Japão e China estão desenvolvendo suas taxonomias com elevado grau de sinergia. Esse alinhamento metodológico será essencial para a interoperabilidade dessas regulações, permitindo um fluxo de capital para atividades elegíveis – aspecto relevante diante do acordo comercial entre UE e Mercosul.

Taxonomia Sustentável Brasileira (TSB)

A TSB adota três etapas para a elegibilidade de uma atividade econômica como sustentável. Para se tornar elegível, é como se a atividade percorresse “portões” com requisitos específicos e cumulativos necessários para acessar o capital direcionado à taxonomia (como financiamentos e investimentos). Por fim, além do acesso ao recurso, deverão ser reportadas as informações relativas aos gastos de capital e despesas operacionais (CapEx e OpEx, respectivamente) enquadradas na TSB.

As etapas da TSB podem ser assim esquematizadas:

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A proposta de TSB traz três critérios cumulativos:

· Contribuir substancialmente com um ou mais objetivos, como a mitigação e adaptação às mudanças climáticas, o uso sustentável das florestas e dos recursos marinhos, a proteção dos recursos naturais e biodiversidade, a transição para economia circular e a prevenção e controle de contaminação;

· Não prejudicar significativamente nenhum dos outros objetivos – ou seja, mesmo que uma atividade contribua substancialmente para um objetivo, ela não pode prejudicar os demais – por exemplo: uma atividade que reduz suas emissões de GEE não pode impactar negativamente a biodiversidade; e

· Cumprir com as salvaguardas mínimas, que são os padrões éticos e legais mínimos aplicáveis às companhias, conforme políticas, processos e práticas adotadas internamente.

A TSB propõe um foco inicial de atividades e setores econômicos, considerando aspectos como significância para emissões de GEE, importância empregatícia, participação em investimento estrangeiro e importância do setor para a cadeia de valor.

Alguns dos setores inicialmente considerados como elegíveis para a TSB são: 

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A regulamentação da TSB objetivando sua implementação ficaria a cargo de órgãos e agências setoriais, como o Banco Central do Brasil (BCB), a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a Superintendência de Seguros Privados (SUSEP).

Com a implementação de uma taxonomia brasileira, espera-se que haja um fluxo crescente de capital direcionado a atividades e projetos elegíveis como sustentáveis, conforme metodologia. Também deve se consolidar a tendência de maior divulgação ao mercado sobre investimentos realizados em tais atividades – aumentando o escrutínio junto a instituições financeiras, sob a ótica de seus portfólios, e das companhias listadas e de grande porte quanto à eficiência na concepção e implementação de despesas com impacto positivo em suas operações.

Não menos importante, a proposta de TSB torna evidente que será exigido (e aguardado pelo mercado) maior protagonismo das companhias listadas e de grande porte, devendo-se estabelecer uma governança interna madura.

Critérios aplicáveis às companhias abertas listadas e empresas de grande porte

Em se tratando de companhias abertas listadas e empresas de grande porte (aquelas com receita operacional bruta maior que R$ 300 milhões, segundo o BNDES), a TSB traz critérios específicos sobre as salvaguardas mínimas e o princípio de não prejudicar significativamente.

Em relação às salvaguardas mínimas, uma série de regulações nacionais e internacionais (Pactos, Convenções e Acordos incorporados ao ordenamento brasileiro) é sugerida, abrangendo regulações sobre direitos humanos e do trabalho, antidiscriminação e igualdade racial e de gênero, direitos dos povos e comunidades tradicionais, ecossistemas e biodiversidade, resíduos, poluição e recursos hídricos.

Como forma de avaliação corporativa, a TSB sugere que as companhias abertas listadas e empresas de grande porte tenham políticas, processos e práticas internas que evidenciem o atendimento aos critérios da taxonomia – incluindo a existência de sistemas de gestão de riscos para identificação, prevenção, mitigação e remediação de riscos e impactos adversos nos aspectos ambientais e sociais abrangidos pela TSB, englobando tanto suas operações diretas quanto sua cadeia de valor.

Para essa avaliação de aderência à TSB, a proposta traz parâmetros e indicadores específicos, como políticas de diversidade, equidade e inclusão; procedimentos formais para resolução de conflitos e não retaliação; procedimentos para consulta e engajamento de comunidades locais; métricas e metas relativas a gênero e raça.

Obrigações relativas a reporte e divulgação

Um dos mecanismos de promoção da transparência e acompanhamento pelas partes interessadas é a estrutura Monitoramento, Relato e Verificação (“MRV”). A proposta não detalha seu funcionamento, mas propõe que haja relato para companhias abertas listadas (de forma voluntária, inicialmente), conforme:

· Não financeiras: Receita total e Receita alinhada à TSB, e CapEx total e Capex alinhado à TSB, ambos em valores absolutos e relativos;

· Financeiras: para as instituições classificadas como segmentos S1 e S2, sugere-se o reporte das operações de crédito (empréstimo e financiamento), participações (por meio de investimentos em empresas) e emissão de títulos para captação (mercado doméstico e exterior), abrangendo os valores absolutos e relativos dos recursos alocados em empresas sustentáveis, segundo os critérios da TSB.

Qual o prazo para contribuições e como participar?

A proposta da TSB está aberta à consulta pública em duas etapas:

· Etapa 1: até 31 de janeiro, estão disponíveis todos os cadernos técnicos e temáticos;

· Etapa 2: de 1º de fevereiro a 31 de março, serão disponibilizados os limites quantitativos de mitigação à mudança do clima, os critérios técnicos de adaptação à mudança do clima e as salvaguardas mínimas específicas dos setores.

As contribuições devem ser enviadas pela plataforma Participa + Brasil.

Termos de Uso

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