Iniciativas de financiamento e investimento lançadas na COP28 ajudarão a cumprir os objetivos do clima e da biodiversidade
Na COP28, em Dubai, os países se deram conta da relevância das florestas, anunciando investimentos, com suporte da iniciativa privada, que garantam sua manutenção e recuperem áreas prejudicadas. Isso porque as florestas ocupam posição central nos esforços de redução das emissões dos gases de efeito estufa, absorvendo carbono quando crescem ou se mantêm e liberando carbono ao serem degradadas ou desmatadas.
Para se ter uma ideia, dados publicados na revista científica Nature Climate Change apontam que, entre 2001 e 2019, as florestas sequestraram cerca do dobro do dióxido de carbono que elas emitiram. Isso significa que apresentaram uma absorção líquida de 7,6 bilhões de toneladas de CO2 por ano – uma vez e meia a mais do que a emissão anual dos Estados Unidos.
Os esforços de preservação e recuperação da natureza, de acordo com as discussões na COP28, podem poupar US$ 104 bilhões em custos de adaptação e têm o potencial de fornecer mais de 30% das ações de mitigação de CO2 necessárias até 2030. Além disso, como metade do PIB global depende direta e indiretamente da natureza e de outros serviços dos ecossistemas, a conservação e restauração são positivas para a economia, com potencial de criar empregos e proteger 1 bilhão de pessoas que dependem financeiramente da natureza.
As florestas tropicais representam o ecossistema mais importante para mitigar as mudanças climáticas, porque sequestram mais carbono da atmosfera do que as temperadas e boreais. As três maiores estão na Amazônia, Bacia do Rio Congo e Sudeste Asiático. Cerca de 10% da superfície do planeta é coberta por elas, mantendo a temperatura cerca de 1ºC mais baixa.
Atuação do Brasil
O Brasil anunciou, já no início da COP28, o modelo de um fundo global para financiar a conservação dessas florestas, com o objetivo de captar US$ 250 bilhões que poderão beneficiar cerca de 80 países. A proposta é destinar o capital investido a ativos verdes, cujo retorno será aplicado na preservação das florestas tropicais. A expectativa é que o fundo esteja pronto na COP30, em 2025, que será realizada em Belém, no Pará.
Além disso, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) lançou, também na COP28, o projeto Arco da Restauração da Amazônia, que pretende financiar a restauração de 24 milhões de hectares da floresta amazônica brasileira até 2050, com um custo estimado de US$ 40 bilhões. Os cálculos apontam que podem ser retirados 1,65 bilhão de toneladas de carbono da atmosfera com a recuperação de 6 milhões de hectares até 2030.
"As emissões brasileiras de gases de efeito estufa, como o CO2, são principalmente provenientes do uso da terra, mais especificamente do desmatamento, diferentemente dos países europeus e dos EUA, por exemplo, cujas emissões estão concentradas em processos industriais e matrizes elétricas. É muito mais barato nosso processo de descarbonização do que o deles", diz Ricardo Assumpção, CSO (Chief Sustainability Officer) da EY e líder de ESG e Sustentabilidade, que participa da COP28 como palestrante e moderador de painéis.
Estudo divulgado nesta semana pela Universidade de Oxford mostra que o Brasil pode zerar completamente suas emissões de gases de efeito estufa em 2050, caso consiga acabar com o desmatamento e investir na recuperação em grande escala da vegetação nativa. Chamada de meta zero, ela define que todos os gases emitidos por um país devem ser compensados pela absorção, por exemplo, decorrente da ação das florestas.
Créditos de biodiversidade
O setor privado pode impulsionar esses investimentos por meio dos créditos de biodiversidade ou biocréditos, que são instrumentos financeiros disponibilizados para empresas e governos com o propósito de incentivar a conservação da natureza.
"Esses créditos contemplam determinada área de biodiversidade, mensurando e contabilizando o capital natural reparado. Ou seja, o instrumento permite recuperar a biodiversidade de determinada região, funcionando de forma semelhante aos créditos de carbono", diz Ana Luci Grizzi, sócia da EY para Climate Change and Sustainability Services, que também está na COP28. "Alguns painéis da COP28, como o do International Advisory Panel on Biodiversity Credits, mostraram a relevância desse instrumento na estratégia de proteger a biodiversidade, especialmente das florestas tropicais tão relevantes no combate ao aquecimento global".
Os projetos precisam seguir critérios estabelecidos e devem criar ou restaurar habitats naturais. O manejo sustentável dos recursos naturais e a proteção de espécies ameaçadas de extinção também são contemplados nessas iniciativas. Reino Unido e França lançaram neste ano uma proposta para expandir esse mercado, para que empresas adquiram créditos de biodiversidade e consigam financiamento voltado para a restauração ambiental.
“Todas as organizações dependem de capital natural. No entanto, a natureza não está sendo contabilizada nas organizações. O objetivo deve ser gerar valor por meio de ativos da natureza, o que significa não apenas mitigar os efeitos das suas operações como também encontrar alternativas inovadoras para problemas que as organizações enfrentam por não considerarem a natureza na tomada de decisão”, destaca Ione Anderson, diretora de consultoria de sustentabilidade da EY, que também está na COP28. “Sobre a biodiversidade, ela precisa ser trabalhada pelas empresas em conjunto com as outras ações de sustentabilidade”.